Por Comunicação JS/A, com tradução e edição do Jubileu Sul Brasil

Os países que compõem o G20 se reúnem anualmente para, segundo eles, tentar, por consenso, medidas que visem a superação da crise, a melhoria do emprego e a garantia da sustentabilidade do mesmo modelo capitalista de acumulação sem fim e gerador de desigualdades. Seus mandatos não são vinculantes, de modo que o cumprimento de suas recomendações depende da vontade política, de suas próprias agendas e interesses dos países membros. Não há votação ou outros procedimentos de tomada de decisão.

A crise capitalista continua e a América Latina e Caribe é uma das regiões mais endividadas do mundo

A grave crise econômica que estamos sofrendo, acentuada pela pandemia, está fazendo com que a dívida pública aumente sem controle, fazendo com que os pagamentos pelo seu serviço se tornem cada dia mais onerosos e desumanos para nossos povos e desviem recursos valiosos que serviriam garantir atendimento e acesso a direitos, gerar empregos e aumentar o investimento social para garantir direitos básicos às populações mais vulneráveis ​​e começar a enfrentar profundas desigualdades.

O pagamento pelo serviço dessa dívida ilegítima e imoral ocupa os primeiros itens na maioria dos orçamentos dos governos da América Latina e do Caribe. Segundo dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), a dívida bruta dos governos representa em média 77,7% do produto interno bruto (PIB) regional, e o serviço total da dívida, ou seja, os juros do endividamento, representa 59% das exportações de bens e serviços.

Grande parte dessa dívida é dívida de mercado: ou seja, foi feita por meio da colocação de títulos no mercado internacional, tendo como principais compradores os grandes bancos e fundos de investimento de Wall Street.

Apesar das medidas impostas pelos governos, para enfrentar as circunstâncias extraordinárias da pandemia e em um contexto histórico de desigualdades, extrativismo e, diferentemente da dívida contraída com instituições financeiras internacionais, para o capital multinacional, a dívida de mercado é um negócio. Sua única função é a geração de crédito dos compradores e as taxas de juros que os países pagam ao custo da proteção social estão sujeitas a uma classificação por agências de crédito independentes. Estes têm sido injustos com os países da região ao se recusarem a adaptar suas metodologias à pandemia.

2022: é hora de cancelar essa escandalosa dívida sem precedentes

Os dados sobre o impacto do endividamento, com base no monitoramento popular e com base nos dados divulgados pelas próprias instâncias capitalistas, nos mostram o quão desigual é a dívida, se partirmos do relatório divulgado pelo Fundo Monetário Internacional.

A CEPAL afirmou em dezembro de 2021 que a América Latina e o Caribe são atualmente a região mais endividada do mundo em desenvolvimento. A dívida bruta do governo geral é em média 77,7% do PIB regional e nos mesmos dados do Banco Mundial sobe para 81,6%, embora em alguns casos ultrapasse 100% do PIB nacional, como o Brasil – 101,4%-; e o serviço da dívida total representa 59% de suas exportações de bens e serviços.

Falsas soluções: continuam a defender apenas os interesses do capital transnacional, branco e patriarcal

A partir de meados de 2021, o G20 anunciou um acordo sobre a introdução de um imposto mínimo global. É uma taxa corporativa global de 15%, a ser implementada em 2023 e que foi aplicada a cerca de 4.000 corporações, incluindo 100 megaempresas digitais. O critério de tributação seria baseado na localização da empresa-mãe e não nas atividades reais em cada país.

Traduzido em realidade, este “acordo” serve apenas aos interesses de um punhado de países, os mais ricos, para não variar. Os países do G7 ganhariam 60% da receita adicional gerada pelo novo acordo fiscal, apesar de terem apenas 10% da população mundial.

Querem que os países assinem um cheque em branco em troca de muito pouco

Se essa avaliação de possíveis resultados fosse feita, mostraria que essa não é uma grande mudança ou uma mudança a favor dos países do sul global. Eles só querem mudar a fachada. Para países fora do G7 não traz grandes benefícios e, em vez disso, estabelece obrigações, como não poder definir impostos adicionais sobre gigantes digitais.

A metodologia para definir esta “solução global” não foi transparente. Devemos ter acesso ao banco de dados usado para estimar o impacto da proposta. A falta de proporcionalidade entre os compromissos que os países em desenvolvimento devem assumir, por exemplo, a proibição de adoção de medidas unilaterais por multinacionais, é preocupante e alarmante.

Trocar dívida externa por ação climática

Uma ideia reciclada gerada pelo FMI em 1984, quando a América Latina passava por uma de suas mais profundas crises de dívida, e proposta por Colômbia e Argentina, que argumentam que, se as nações devedoras se comprometessem a proteger os recursos naturais, poderiam optar por “descontos” na dívida. 

Essa iniciativa de troca busca ganhar pontos, sem injeção de divisas, e busca aumentar a capacidade do país devedor de pagar os empréstimos. Essas trocas de dívida por natureza levaram à criação de novas áreas protegidas, que não têm sido uma solução abrangente ou sustentável, pois resultam na militarização de territórios, desapropriação e criminalização de povos indígenas, conflitos territoriais e uma das razões pelas quais o assassinato, desaparecimento e massacres de ativistas, jornalistas, indígenas e lideranças continuam “quebrando recordes”. 

Embora esta fosse outra das falsas soluções apresentadas pela Argentina na COP 26, e respaldada pelo G20, ressaltamos que a história nos aponta para as tentativas fracassadas de troca de dívidas na Bolívia e no Brasil, em 1989.

A Rede Jubileu Sul/Américas tem levantado, documentado e denunciada o mecanismo da dívida como um instrumento capitalista de espoliação, sempre deixando em primeiro plano que, como consequência de décadas de imposição de políticas extrativistas, coloniais e racistas, são os povos do sul global os verdadeiros credores de uma dívida não apenas histórica, mas também ecológica.

Antes da próxima reunião do G20, continuaremos levantando nossas vozes para a auditoria dessa dívida imoral – pois quem dela enriqueceu é quem deve pagá-la – e pela anulação de todas as dívidas que impactam a liberdade e a soberania dos corpos, terras e territórios .

Não deixaremos de denunciar que a armadilha da dívida não se resolve ou se enfrenta com mais dívidas. Além disso, conhecer os riscos, impactos e ameaças reais do endividamento sobre os órgãos e territórios deve ser um conhecimento aberto, público e acessível.

A marcha para nos libertar da opressão da Dívida não para!

Somos os povos, as mulheres, a natureza, os verdadeiros credores de uma dívida histórica, social e ecológica!

Esta dívida imoral e ilegal NÃO SE PAGA!

Exigimos reparação e cancelamento da dívida!

Acesse a íntegra da nota do Jubileu Sul/Américas (em espanhol):

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