Organizações religiosas e movimentos populares, entre eles a Rede Jubileu Sul Brasil, seguem na mobilização, formação e divulgação do Projeto Encantar a Política.
Por Osnilda Lima | Comunicação 6ª SSB e Pastorais Sociais da CNBB
Envolver ou ser envolvido por algo, maravilhar, seduzir, enlevar, agradar muito a; essas são algumas das definições da encantar, já a política acontece no ato de existir em grupos, em conjunto, no coletivo, remonta à participação na comunidade, na sociedade; esta pode ser uma das definições de política.
Por esse motivo, organizações religiosas e movimentos populares propõem o Projeto Encantar a Política, lançado em abril deste ano. E para seguir o processo de formação e mobilização nacional, nos dias 13 a 15 de maio, foi realizado em Brasília (DF), o Seminário Encantar a Politica: Eleições Gerais 2022. Participaram lideranças de todo o território nacional, com representações das cinco regiões do Brasil.
Mas por que Encantar a Política? Segundo Robson Sávio Reis Souza, pós-doutor em Direitos Humanos, doutor em Ciências Sociais e coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas, é preciso sim reencantar a política, pois a mesma passa por um processo de criminalização. De acordo com o pesquisador, “a partir de 2013 ocorreu um sistemático ataque contra todo o sistema político, principalmente partidário. Isso se deu através de uma ideia propagada, em especial pela mídia empresarial, de que todo o sistema político tradicional e institucional, os partidos e os agentes políticos, é caracterizado pela corrupção e tem na administração do Estado o único interesse de se locupletar”, enfatiza.
“Houve uma tentativa de formação da opinião pública: primeiro, criminalizando tudo o que tem a ver com o Estado; portanto, criminalizar as instituições políticas, os partidos, as políticas públicas, as políticas sociais, e, em segundo lugar, consolidar no imaginário popular a ideia de que o que vale são as iniciativas individuais e privadas e o esforço individual das pessoas”. E nesse sentido, segundo Robson, a política, principalmente a política institucional, torna-se um espaço no qual grupos de pessoas da sociedade a usam para se manterem no poder. Ele traz o exemplo da operação Lava Jato que corroborou com essa ideia de que “tudo o que tem relação com o sistema político é permeado pela corrupção; por interesse de pessoas que se apropriam de bens do Estado, e que, portanto, a melhor forma de se combater e evitar isso seria uma espécie de defesa da antipolítica, no sentido de que se criminalizar as instituições e as pessoas que exercem cargos e funções públicas”, destaca.
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O pesquisador ressalta que nesse aspecto da criminalização da política, produziu-se “um asco por parte da população, uma aversão muito grande da política; um afastamento da vida pública e da vida política, com aumento do absenteísmo eleitoral, votos brancos, nulos e abstenções”. Com isso, conforme Robson, fortaleceu-se a ideia de que qualquer pessoa que ocupa o um cargo público é corrupta e acabou redundando numa apropriação dos espaços políticos por pessoas da pior qualidade que foram eleitas com o discurso da antipolítica. “Hoje, quando observamos a cena da política institucional, muitos que foram eleitos para cargos no executivo e legislativo são pessoas que não têm nenhum compromisso e interesse com as coisas públicas e só estão lá para defender interesses de grupos e corporações privados. Isso se relaciona com a ideia de um estado mínimo e de políticos que não têm interesse com preservação de estado de direito, com as políticas públicas e as próprias instituições democráticas”, analisa o pesquisador.
Robson Sávio adverte que, “atualmente observamos nos parlamentos, da câmara de vereadores até o Congresso Nacional, uma geração de políticos que não têm nenhum compromisso com os princípios basilares da democracia, do estado de direito; com a defesa de igualdade, da dignidade humana, justiça e paz social. Isso porque eles surfaram nessa onda antipolítica e foram eleitos por cidadãos que passaram a desacreditar em tudo o que tenha a ver com a ideia de estado, política pública, democracia, direitos humanos, etc.”. Por fim, conforme o pesquisador, o resultado dessa aversão à política, da onda de criminalização da política e da antipolítica favoreceu a assunção de um tipo de governante que “defende interesses de pequenos grupos, em detrimento dos interesses sociais. Não há compromisso com a totalidade dos interesses coletivos e públicos”, grifa.
A dimensão política da fé
Segundo dom Giovane Pereira de Melo, bispo de Tocantinópolis (TO) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para o Laicato da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Igreja no Brasil sempre tomou posições a favor da democracia, da cidadania participativa, do voto consciente. E, em conformidade com esse posicionamento, segundo o bispo, é que o projeto Encantar a Politica é oferecido à sociedade como “um mutirão de cristãos, cristãs e pastores” pelo Encantar a Política. Isso porque, de acordo com dom Giovane, o projeto foi discutido no Conselho Episcopal Pastoral da CNBB e aprovado no Conselho Permanente, órgão de orientação e acompanhamento da atuação da CNBB e dos organismos a ele vinculados.
“O Projeto quer resgatar a beleza do que é a política. A política é a essência do que nós precisamos ter para a garantia de vida, de políticas públicas, de acesso a bens a serviços”, reforça Sonia Gomes, presidente do Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB). Sonia fez referência ao escritor Rubem Alves, ao dizer que o bom político é aquele que sonha em construir um grande jardim público, não um grande jardim particular.
Nilton Júnior, da Igreja Batista do Coqueiral (PE), lembra que tem pessoas ganhando muito com a visão distorcida sobre a política. “Quando nos distanciamos da política, algumas pessoas mal-intencionadas se apoderam deste espaço e legislam em função própria. Por isso, é tão importante que a gente possa, de novo, se encantar com a política e encantar outras pessoas, para que juntos possamos participar e engrossar esse coro, em busca de justiça social, um país mais igual, que defenda quem mais precisa”, afirma.
“Estamos em ano eleitoral, e todos nós, cidadãs e cidadãos brasileiros precisamos participar. Precisamos dizer qual é a nossa pauta, quais os compromissos que exigimos. É momento de exercermos a nossa cidadania. Temos que nos envolver, eleger nossas pautas principais, participar dos debates, questionar candidatos e cobrar compromissos. Depois de eleitos, acompanhar também. Só assim será possível evitar a corrupção, as fraudes e as traições”, recomenda Maria Lúcia Fattorelli, da Comissão Justiça e Paz da CNBB e da Auditoria Cidadã da Dívida.
Organizações mobilizadoras do Encantar a Política
Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB), Centro Nacional de Fé e Política Dom Helder Câmara (CEFEP), Comissão Brasileira de Justiça e Paz (CBJP), Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas e Arquidiocese de Belo Horizonte (NESP), Rede Brasileira de Fé e Política (REFEP), 6° Semana Social Brasileira (6ªSSB), Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Sociotransformadora da CNBB (CEPAST), Movimento Nacional de Fé e Política (MF&P), coletivo dos Padres da Caminhada, as Comunidades Eclesiais de Base (CEB’s), Pastoral da Juventude (PJ), Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e a Comissão Episcopal para o Laicato (CEPL).
Assista ao lançamento da Cartilha Encantar a política