Por Rogéria Araújo | Comunicação Jubileu Sul Brasil
“Mãe a gente cuida, mãe não se negocia e não se vende”. Foi nessa vibração que teve início, em São Paulo, o Seminário Regional “Financeirização da Natureza – O que é feito em nome do clima e do meio ambiente?”, que reuniu cerca de 60 participantes. Povos indígenas, pescadores caiçaras, quilombolas, pequenos agricultores/as, acampados/as do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) participaram ativamente num objetivo comum: como se articular diante do capital que vem destruindo povos tradicionais em nome de projetos cada vez mais desenvolvimentistas.
O evento foi uma realização da rede Jubileu Sul Brasil e do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social, com apoio da Misereor, CAFOD e FASTNOPFER. e aconteceu de 15 a 17 de julho. A proposta foi juntar num mesmo espaço as comunidades que são atingidas por esse modelo colocado pelo Estado. Assim, o Seminário contou com representantes dos atingidos pelas empresas de celulose do Vale do Paraíba, Vale do Ribeira, litoral Norte de SP, além de comunidades da Capital como representantes da Terra Indígena Jaraguá e do interior, da região de Promissão.
Ivo Poletto, do FMCJS, o primeiro facilitador do Seminário, falou como ao longo dos anos o Planeta Terra foi sofrendo modificações e, aos poucos, foi explicando como o capital, o modelo capitalista, foi se apropriando dos bens naturais e as consequências que temos decorrentes dessas formulações em sociedade. Indagou: Quantas florestas haviam há 100 anos? Muitas! Hoje o que sobra de floresta no planeta de Terra? Quase nada! Tanto que a gente olha para a Amazônia desesperado. Não podemos derrubar mais nenhuma árvore!”.
Em todo esse contexto de financeirização, que transforma tudo em bens de consumo, a natureza passou a ser vista com mais um produto a ser comercializado. “Sabe quem ajudou isso? Foi quem inventou a maldita ideia que temos que ficar ricos. Foi essa concentração de riqueza. E para ficar rico tem que usar o dinheiro que tem para poder produzir, comprar terrar, derrubar floresta, colocar soja. Não estão querendo que a gente se alimente, estão querendo vender”, afirmou Poletto.
Com um olhar mais científico, o antropólogo Adrian Ribaric, falou sobre a forma mítica que, afirmou, está presente em toda forma de pensar, inclusive no pensamento ocidental e científico. Também dentro dessa lógica, o mercado vai mudando as relações. A pessoa, o ser humano, é aquilo que ele tem. “Esse preço que ela, a pessoa, vale – esse é o primeiro grande mito.
“Daí se seguem com outros. De como a natureza se transforma duplamente em mercadora. Primeiro quando ela é matéria-prima. Outro mito: o da natureza selvagem, natureza pura, virgem, como se a natureza pudesse existir sem o homem”, falou, acrescentando que esta dissociação é uma criação. O homem, como ser genérico, ele é natureza. “A gente morre, apodrece. A cultura não se opõe à natureza, pelo contrário. Pescadores, ribeirinhos, quilombolas sabem muito bem disso. Há uma outra maneira de olhar o mundo, de sentir responsabilidade pelo mundo, pelo cuidado”.
O monocultivo do eucalipto em grande escala – problema que afeta grande parte do Vale do Estado de São Paulo, foi bem destacado pelo defensor público, Wagner Giron. Ele demonstrou como pequenos agricultores são atingidos pelas plantações, geralmente financiadas por grande empresas do ramo e de como isto vem acabando com a Mata Atlântica.
O uso de pesticidas e outros elementos para garantir o plantio do eucalipto, de acordo com as denúncias que recebe, vêm causando doenças pulmonares e até casos de câncer nos moradores. “Falta de diálogo com as populações que são afetadas por obras, estradas, pelo corte de eucalipto. É um estrago muito grande. O pior de tudo é que a liminar contra uma família sai por telefone, mas com essas empresas não acontece nada. Por que ? Porque elas são as grandes financiadoras de campanhas políticas. Usam nossa água, nosso sol e nosso solo. O que sobrou de Mata Atlântica? Essas empresas detêm milhares de hectares de eucalipto”, enfatizou o defensor.
Giron acrescentou que a forma violenta com a qual se degrada a terra e o ciclo natural dos cultivos locais. Explicou que além de não ser uma espécie nativa, o eucalipto leva 5 anos para crescer a ponto de colher. Enquanto normalmente, na Austrália, a planta leva 40 ou 50 anos para se desenvolver. “É uma perversidade contra os povos tradicionais, enquanto essas empresas fazem o que querem com a natureza”, falou.
Como sempre ressalta a rede Jubileu Sul Brasil: Eucalipto não é floresta!
Caderno de Estudo sobre Economia Verde
Dentre os materiais distribuídos para os/as participantes do Seminário, estava o Caderno de Estudo “Economia Verde – O que é feito em nome do clima e do meio ambiente”. A publicação aborda temas de extrema importância para entender porque a natureza – ao longo de décadas – passou a ser mercadoria rentável para o capital e sugere reflexão para todos e todas que militam ou estudam nesta área.
Para ter acesso on line, basta clicar em: http://jubileusul.org.br/nota/3862