Nota do Jubileu Sul Brasil sobre a Cúpula de Líderes do grupo das 20 entre as maiores economias do mundo (G20)

A Rede Jubileu Sul Brasil luta, há 25 anos, por uma sociedade livre da dominação e exploração dos mecanismos do endividamento público e demais formas de reprodução de ‘dívidas sociais’, promovido pela classe dominante e as elites para os setores populares. Ou seja, dívidas das quais os povos são os verdadeiros credores. Por isso, nosso lema sempre foi: “não devemos, não pagamos: somos os credores!”. Assim, o que nos interessa é trabalhar junto com os movimentos sociais para denunciar e saldar as ‘dívidas históricas e colonial’ que as classes dominantes, junto dos Estados e governos por elas comandados, impuseram sobre nós: da ‘dívida ecológica’, por conta da destruição de nossos territórios e recursos naturais, a  ‘dívida democrática’, que nos rouba mecanismos de decisão e participação política; e, claro, a ‘dívida financeira’, que usurpa os recursos do orçamento público para os (supostos) credores privados

Nossa posição sobre a legitimidade do poder político, em qualquer escala, sempre foi nítida e inegociável: defendemos a soberania popular como a única fonte legítima de autoridade no mundo que lutamos para construir. Segundo este princípio, nenhum governante ou grupo de líderes políticos pode se autoproclamar no poder para promover a ‘governança’ de um corpo político qualquer, local ou global. Nunca aceitamos a farsa de Juan Guaidó na Venezuela, nem o golpe que levou Michel Temer à presidência do Brasil em 2016, episódios que jogaram ambos os países nas delicadas situações políticas que hoje se encontram. Pela mesma razão, dissemos não à ALCA e às constantes intervenções estrangeiras sobre o Haiti, quando muitos silenciaram sobre o tema: porque a soberania dos povos é inegociável.

Não pode ser vendida num tratado de livre-comércio (como querem agora os governos com o Acordo de Livre Comércio União Europeia x Mercosul) ou na cobiça por um lugar permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas – ONU esta que é repleta de imperfeições, fruto de sua condição de arena de poder mundial no jogo das grandes potências. Mas trata-se de uma instituição pública, fundada sob princípios democráticos e igualitários (com uma exceção, sabemos), cuja função é promover a paz e os direitos humanos no mundo. Uma organização onde todos os países, até os mais débeis economicamente ou insignificantes do ponto de vista militar, podem se expressar e votar sobre os temas de interesse global.

Apesar da captura corporativa de várias de suas agências e órgãos consultivos – contra a qual também lutamos – a ONU segue como o único instrumento internacional com sua legitimidade política fundada na escolha livre de todos os povos soberanos do planeta.

Por outro lado, arranjos informais como o G7 ou, agora, o G20, não possuem qualquer legitimidade para tomar decisões graves e onerosas em nosso nome. Grupos autoproclamados como estes dizem promover o ‘bem comum’ ao liderarem aquilo que chamam de ‘governança’ global. Mas os povos de África, Ásia, América Latina e Caribe sabem que o bem-viver não passa pelas mãos dos gestores do capitalismo global.

Surgido como ator relevante no rescaldo da crise financeira mundial de 2008-2009, o G20 aparenta incluir o Sul global nas decisões sobre os destinos do planeta. No entanto, sabemos que as únicas decisões possíveis de serem tomadas em um fórum como este (que inclui adversários em conflito, como a Rússia e os Estados Unidos) são aquelas destinadas a salvar o capitalismo global das crises que ele mesmo provoca e fomenta. O ‘salvar’ com a ajuda do Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, que seguem comprometendo as capacidades dos países do Sul global atendendo os interesses do capital financeiro.

Os recursos públicos desviados pelo G20 dos povos do mundo inteiro foram parar no setor privado rentista, que privatizou a riqueza e transformou-a em novo impulso de especulação financeira. Na verdade, assim como a nossa dívida pública, o que o G20 precisa é de uma auditoria integral. Aqueles que numa manobra decidiram estatizar dívidas dos grandes bancos e investidores privados, cortando políticas sociais em toda parte como consequência, devem respostas aos povos deste planeta. Não é o ‘mercado’ que deve ditar os rumos da ‘governança’ global. O nível de endividamento e financeirização da economia mundial atingiu patamares inimagináveis antes da intervenção inaugural do atual G20: exigimos reparações imediatas por esta dívida também!

A eleição do Trump para a Presidência dos Estados Unidos nos leva a crer que muitos processos no campo da democracia e dos direitos humanos irão se fragilizar. No Brasil, o bolsonarismo se fortalece, a extrema-direita, com uma base social mais ampliada, sente-se mais à vontade para, no Congresso Nacional e nos parlamentos estaduais, aprovarem suas pautas mais retrógradas, como aquelas relacionadas aos direitos das mulheres e da população LGBTQIA+; aquelas que facilitam mais ainda a entrega de territórios indígenas e de povos tradicionais aos agentes nacionais do mercado internacional de commodities. Refém do sistema financeiro por vontade própria, o governo Lula tende a alinhar sua política externa, se afinando com os interesses do governo Trump na América do Sul.

É, portanto, ao lado dos povos, na Cúpula dos Povos frente ao G20, que a Rede Jubileu Sul Brasil se posiciona. Somos contra reuniões de cúpula que servem para perpetuar o poder dos ricos até quando falam em nome dos pobres: um imposto mundial sobre grandes fortunas parece uma ótima ideia, até que seja revelada a participação de instituições financeiras internacionais (IFIS), como o FMI na dianteira do tal ‘combate à pobreza’, impondo aos países arcabouços fiscais que geram ainda mais desigualdade e pobreza.

Além de pouco provável na reunião deste ano, acordos de cavalheiros entre elites globais não atendem aos interesses, reivindicações e necessidades dos povos em luta, já que os gestores do capitalismo jamais irão acabar com as desigualdades, pois este sistema de apropriação requer mais e mais exploração de pessoas e dos recursos naturais para seguir adiante com sua infinita acumulação de capital.

Chega de bilionários! Basta de autoproclamados donos do mundo!

No dia 14 de novembro de 2024, na Cúpula dos Povos frente ao G20, no Rio de Janeiro, no dia 15, no Tribunal Popular: O imperialismo no banco dos réus, e no dia 16, na Marcha dos Povos “Palestina Livre do Rio ao Mar. Fora Imperialismo!” que, seguimos em luta e estaremos outra vez no embate contra a financeirização da vida, da natureza e da política nacional e internacional. Contra a dominação social, via endividamento, e pela soberania dos povos. Exigindo reparações de todas as dívidas sociais, históricas, climáticas e financeiras, pois, afinal, não devemos, não pagamos. Somos nós – os povos em luta – os credores.

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