Os resultados das recentes eleições gerais no Paraguai e das eleições para o Conselho Constituinte no Chile acendem um sinal vermelho para toda América do Sul. A mudança da geopolítica mundial está acirrando o imperialismo que se contorce para sobreviver. 

O cenário reaviva antigas questões que voltam à cena de maneira sorrateira. A embaixada dos Estados Unidos, que jogou um papel importante para a vitória de Peña no Paraguai, como estará se movendo por aqui? E na Argentina? Quais acordos não explícitos estão em curso em toda América do Sul? As forças da esquerda brasileira estão fazendo uma leitura crítica, que leve em consideração elementos da nova organização geopolítica norte americana em disputa com outras economias emergentes por esse pedaço do mundo?

A ausência de uma análise geopolítica, comprometida com a soberania e a luta para a superação das desigualdades no cenário regional, em breve pode nos trazer mais notícias ruins. A vitória do Partido Colorado no Paraguai e da ultra direita para o Conselho Constituinte no Chile acende no mínimo o sinal amarelo para a eleição na Argentina, marcada para outubro deste ano. O país conseguirá sair da última crise que ingressou em 2015? Por lá, los hermanos também vão precisar enfrentar uma eleição que contará com as pretensões de Javier Milei, o “Bolsonaro argentino”, à Presidência da República. 

Um sobrevoo pelos recentes processos eleitorais na América do Sul faz-nos perceber uma constante: governos desenhados a partir de coalizões recheadas de contradições políticas e ideológicas, e com um esforço da extrema direita cada vez mais tomando força e forma. A eleição do presidente Lula é o símbolo mais emblemático desse cenário na América do Sul. Para enfrentar as investidas da extrema direita, partidos de esquerda se alinham com siglas conservadoras. Como essa dança das cadeiras ressoa na população? Quando vamos discutir o papel da esquerda na América do Sul? Como a fragilidade dos partidos políticos e dos processos formativos nesse campo estão moldando o futuro das nossas democracias? Para onde essas coalizões estão nos levando? Com tais acordos em curso, vamos mesmo conseguir colocar as pessoas que sofrem com as desigualdades no orçamento público e enfrentar processos históricos de exclusão e privilégios? Qual a diferença dos governos identificados com a esquerda para governos neoliberais na visão da população mais empobrecida? 

A população precisa fazer essa identificação a partir das ações concretas, a partir das prioridades presentes, por exemplo, no orçamento público e na administração da dívida pública. No Brasil, sabemos para onde caminha a política econômica. O pagamento dos juros da dívida continua a sugar tudo que temos enchendo os bolsos do setor financeiro, rentista e bancário.

Neste cenário, como devemos nos articular enquanto movimentos sociais e populares?

Com o argumento de evitar o fascismo, a esquerda tem assumido duas posturas. De um lado, entra para o governo, se dedica de corpo e alma na atividade, e fica feliz pois acha que está dando uma grande contribuição para melhorar a situação brasileira. De outro, devido as mudancas na organizacao do trabalho, a esquerda social se volta para a luta contra as opressões – feminista, antirracista,  LGBTQIA+Fobia, ambientalista – que tem um caráter importante na organização social, mas não sinaliza para uma mudança social se não estiver incluída na luta contra o capitalismo.

Outra questão importante: foi uma grande vitória a derrota eleitoral de Bolsonaro. Ao mesmo tempo, sabemos dos limites do governo eleito, constituído por uma frente amplíssima. Portanto, seguramente não vai mexer no essencial, como já foi demonstrado com o arcabouço fiscal. Por que o parlamento brasileiro tem agora tanta pressa para aprovar o novo arcabouço fiscal? Por que não fazem nenhum esforço para incluir a população nesse debate fundamental para nosso destino enquanto país?

A chave para as transformações que desejamos, enquanto movimentos sociais e populares, está na formação política contínua. Sem processos de conscientização e democratização do direito à informação não será possível avançar nas lutas por um parlamento mais qualificado, comprometido com o acesso da população aos direitos essenciais e ao crescimento da economia pautada na responsabilidade social e ambiental. Só com muito esforço na mobilização de processos formativos vamos eleger governos menos comprometidos com as demandas do capital e mais preocupados com a vida real das pessoas.

Não devemos, não pagamos!
Somos os povos, os credores!

Rede Jubileu Sul Brasil, 10 de maio de 2023. 

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