Com sessão prevista para iniciar às 14h desta quarta-feira (8), a expectativa é que a Corte garanta os direitos originários dos povos; em Brasília e nos territórios, os indígenas irão acompanhar o julgamento.
Redação | Assessoria de Comunicação da ANMIGA
Mais de 4 mil mulheres guerreiras da ancestralidade, reunidas na II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, mobilizam-se para acompanhar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que irá definir o futuro das demarcações de terras indígenas no Brasil.
Marcada para começar às 14h desta quarta (8), a sessão da Suprema Corte deverá ser retomada com a leitura dos votos dos ministros e das ministras. A sessão anterior, realizada na última quinta-feira (2), terminou com a manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o caso. Na semana anterior, o ministro Edson Fachin fez a leitura do relatório inicial, as partes envolvidas no processo realizaram suas sustentações orais e os amici curiae – “amigos da corte” deram suas contribuições para o entendimento do caso.
“Hoje é um dia decisivo para o futuro do julgamento, porque entra na etapa dos votos dos ministros, começando pelo voto do ministro relator, Edson Fachin, em seguida abre para os demais ministros”, explica Samara Pataxó, assessora jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
O primeiro ministro a apresentar seu voto é o relator do caso. Só depois, os demais votos serão apresentados, em ordem crescente de antiguidade – do mais novo para o mais antigo -, ou seja, do ministro Nunes Marques para o ministro Gilmar Mendes (decano), votando por último o presidente da Corte, ministro Luiz Fux.
“Hoje é um dia decisivo para o futuro do julgamento, porque entra na etapa dos votos dos ministros, começando pelo voto do ministro relator, Edson Fachin, em seguida abre para os demais ministros”
Conheça as teses em disputa
O Supremo está analisando a reintegração de posse movida pelo IMA – Instituto do Meio Ambiente (IMA), de Santa Catarina, contra o povo Xokleng, referente à TI Ibirama-Laklãnõ, onde também vivem os povos Guarani e Kaingang. Em 2019, a Corte reconheceu a “repercussão geral” do caso, ou seja, a decisão servirá de diretriz para a gestão federal e todas as instâncias da Justiça no que diz respeito aos procedimentos demarcatórios.
No centro da disputa há duas teses: de um lado a tese do chamado marco temporal, defendida pelos ruralistas e que restringe os direitos indígenas, e do outro a defesa do direito originário e da tradicionalidade da ocupação indígena como critério para as demarcações de terras indígenas.
Segundo a tese restritiva do marco temporal, os povos indígenas só teriam direito à demarcação das terras que estivessem em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Além de trazer o ônus da prova da disputa por seus territórios para as comunidades, a tese ignora e ao mesmo tempo legitima, o histórico de expulsões e violências sofridas pelos povos indígenas antes da data. Essa tese é defendida pelos setores mais retrógrados do agronegócio, além de outros setores interessados em explorar os recursos em terras indígenas.
“No centro da disputa há duas teses: de um lado a tese do chamado marco temporal, de outro a a teoria do indigenato”
Oposta ao marco temporal está a “teoria do indigenato”, consagrada pela Constituição Federal de 1988. De acordo com ela, o direito indígena à terra é originário, ou seja, é anterior à formação do próprio Estado brasileiro, cabendo ao poder público apenas declarar seu reconhecimento. Sem fazer qualquer menção a um marco temporal, a Constituição de 1988 estabelece a tradicionalidade da ocupação indígena como único critério para as demarcações. Essa tese é defendida pelos povos e organizações indígenas, indigenistas, ambientalistas e de direitos humanos.
Os povos indígenas afirmam “a nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas”. Também, asseguram seguir “resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo”.
Mobilização permanente
Entre os dias 22 e 28 de agosto, seis mil indígenas, de 176 povos de todas as regiões do país, estiveram presentes em Brasília, reunidos no acampamento “Luta pela Vida” para acompanhar o julgamento no STF e lutar em defesa de seus direitos, protestando também contra a agenda anti-indígena do governo Bolsonaro e do Congresso Nacional.
Com o objetivo de seguir acompanhando o julgamento, os indígenas decidiram manter a mobilização em Brasília e nos territórios. Assim, cerca de 1.200 lideranças indígenas, representando seus povos, permaneceram na capital de forma permanente e agora o grupo une forças com a II Marcha Nacional das Mulheres Indígenas.
Em Brasília ou nos territórios, “estamos em busca da garantia de nossos territórios, das que nos antecederam, para as presentes e futuras gerações, defendendo o meio ambiente, este bem comum que garante nossos modos de vida enquanto humanidade. Para além de mero recurso físico é igualmente morada dos espíritos das florestas, dos animais e das águas da vida como um todo, fonte de nossos conhecimentos ancestrais”, reforça a coordenação da Marcha.