por Marcos Arruda, educador do Instituto Pacs
O domínio masculino, que gerou a cultura patriarcal, dura mais de 10.000 anos. Ele alcança um ápice no capitalismo globalizado, que explora a mulher mais agudamente do que o homem e consuma o divórcio cruento entre a humanidade e o meio natural. O sistema do capital preserva as diferenças de tratamento entre o homem e a mulher no campo do trabalho, da ciência, da política, da economia, da cultura. Ele apresenta aberrantes índices de agressão doméstica e social à mulher – assédio sexual, violência física, estupro, incriminação da mulher vitimada; disparidades no rendimento e no tratamento no campo, na fábrica, no escritório, nas igrejas, sinagogas e mesquitas. Tudo isto agravado pela hipocrisia de muitos homens em resposta a críticas e julgamentos em processos.
Este tratamento desumano à mulher hoje se estende às chamadas “outras opções sexuais” e também à Mãe Terra. O protagonista é sempre o “homem macho”, aquele cuja força física, do braço, da voz e do grito, tenta se sobrepor à da mulher. E o gradual e irreversível empoderamento da mulher nos últimos 40-50 anos abala a segurança dos “homens machos”. Se sua autoestima está estribada no domínio que exercem sobre a mulher, eles se sentem inseguros e usam de mais agressividade quando as veem empoderar-se e afirmar-se por si mesmas, e não à sombra deles ou pela dependência deles. Este fato tem um componente psicológico, para além do político, que é preciso desvelar e tratar de forma adequada. Cabe aos homens se conscientizarem dele e buscarem os meios de enfrenta-lo e supera-lo. Se há amor entre casais ou amiga e amigo, a ajuda da mulher para que o homem dê o salto quântico do machismo para o respeito e o tratamento igualitário é indispensável.
Mas aí está também outro elemento a considerar. Na minha visão, a superação da cultura patriarcal multimilenar não se dará rapidamente. Ela irá cedendo pouco a pouco, à medida que mais mulheres assumem seu processo autolibertador. O certo é que “ninguém liberta ninguém, e ninguém se liberta sozinho. Nós nos libertamos em comunhão…” (paráfrase de Paulo Freire) Diferentemente dos contos medievais que promoviam o amor romântico, o homem não liberta a mulher, mas é ela que tem que libertar-se, e isto porque ela não é só sujeita à dominação dos “homens machos”, mas também da auto-opressão que a cultura patriarcal lhe ensinou desde que ela nasceu. Quanto aos homens, o mesmo acontece: além de saírem da posição de opressores das mulheres na relação interpessoal e social, eles têm que libertar-se a si mesmos da figura de dominadores que a cultura patriarcal os treinou a desempenhar.
Meu entendimento da questão leva à seguinte conclusão. A desigualdade social entre os gêneros, e a dominação exercida multimilenarmente pelos homens sobre as mulheres, para serem efetivamente superadas nas dimensões política e social, tanto quanto na cultural e psicológica, precisam de um período de transição em que o protagonismo deve ser das mulheres, até irmos gradualmente alcançando uma harmonia equitativa sem esforço, espontânea, gratuita e voluntariamente recíproca. A esta eu chamo de comunhão criativa no amor incondicional. Mas isto fica para outra conversa.
Termino relembrando um aspecto muito importante da questão feminista. Não se trata apenas de superar o domínio e a opressão dos homens sobre as mulheres. Trata-se de reconhecer a “anima” feminina do homem e o “animus” masculino da mulher (Jung). Trata-se de identificar no corpo do homem os traços femininos que ficaram marcados nele antes que nossas células se especializassem na distinção dos sexos (peitos, costura do escroto…) Trata-se de integrarmos as dimensões masculina e feminina do nosso ser numa harmonia dinâmica, que eduque nossas diversas inteligências e maximize o desenvolvimento da nossa criatividade e amorosidade. Trata-se de ler o mundo pelas duas óticas – a do Feminino e a do Masculino – ao mesmo tempo. Trata-se de reconhecer e respeitar as diferenças entre os gêneros, sem nos iludirmos de que são “opostos” e “incompatíveis”, mas acolhendo-os como complementares e indissociáveis!
Rio de Janeiro, 21.11.17
Dedicado a Catita, Sasha e Joana
O domínio masculino, que gerou a cultura patriarcal, dura mais de 10.000 anos. Ele alcança um ápice no capitalismo globalizado, que explora a mulher mais agudamente do que o homem e consuma o divórcio cruento entre a humanidade e o meio natural. O sistema do capital preserva as diferenças de tratamento entre o homem e a mulher no campo do trabalho, da ciência, da política, da economia, da cultura. Ele apresenta aberrantes índices de agressão doméstica e social à mulher – assédio sexual, violência física, estupro, incriminação da mulher vitimada; disparidades no rendimento e no tratamento no campo, na fábrica, no escritório, nas igrejas, sinagogas e mesquitas. Tudo isto agravado pela hipocrisia de muitos homens em resposta a críticas e julgamentos em processos.
Este tratamento desumano à mulher hoje se estende às chamadas “outras opções sexuais” e também à Mãe Terra. O protagonista é sempre o “homem macho”, aquele cuja força física, do braço, da voz e do grito, tenta se sobrepor à da mulher. E o gradual e irreversível empoderamento da mulher nos últimos 40-50 anos abala a segurança dos “homens machos”. Se sua autoestima está estribada no domínio que exercem sobre a mulher, eles se sentem inseguros e usam de mais agressividade quando as veem empoderar-se e afirmar-se por si mesmas, e não à sombra deles ou pela dependência deles. Este fato tem um componente psicológico, para além do político, que é preciso desvelar e tratar de forma adequada. Cabe aos homens se conscientizarem dele e buscarem os meios de enfrenta-lo e supera-lo. Se há amor entre casais ou amiga e amigo, a ajuda da mulher para que o homem dê o salto quântico do machismo para o respeito e o tratamento igualitário é indispensável.
Mas aí está também outro elemento a considerar. Na minha visão, a superação da cultura patriarcal multimilenar não se dará rapidamente. Ela irá cedendo pouco a pouco, à medida que mais mulheres assumem seu processo autolibertador. O certo é que “ninguém liberta ninguém, e ninguém se liberta sozinho. Nós nos libertamos em comunhão…” (paráfrase de Paulo Freire) Diferentemente dos contos medievais que promoviam o amor romântico, o homem não liberta a mulher, mas é ela que tem que libertar-se, e isto porque ela não é só sujeita à dominação dos “homens machos”, mas também da auto-opressão que a cultura patriarcal lhe ensinou desde que ela nasceu. Quanto aos homens, o mesmo acontece: além de saírem da posição de opressores das mulheres na relação interpessoal e social, eles têm que libertar-se a si mesmos da figura de dominadores que a cultura patriarcal os treinou a desempenhar.
Meu entendimento da questão leva à seguinte conclusão. A desigualdade social entre os gêneros, e a dominação exercida multimilenarmente pelos homens sobre as mulheres, para serem efetivamente superadas nas dimensões política e social, tanto quanto na cultural e psicológica, precisam de um período de transição em que o protagonismo deve ser das mulheres, até irmos gradualmente alcançando uma harmonia equitativa sem esforço, espontânea, gratuita e voluntariamente recíproca. A esta eu chamo de comunhão criativa no amor incondicional. Mas isto fica para outra conversa.
Termino relembrando um aspecto muito importante da questão feminista. Não se trata apenas de superar o domínio e a opressão dos homens sobre as mulheres. Trata-se de reconhecer a “anima” feminina do homem e o “animus” masculino da mulher (Jung). Trata-se de identificar no corpo do homem os traços femininos que ficaram marcados nele antes que nossas células se especializassem na distinção dos sexos (peitos, costura do escroto…) Trata-se de integrarmos as dimensões masculina e feminina do nosso ser numa harmonia dinâmica, que eduque nossas diversas inteligências e maximize o desenvolvimento da nossa criatividade e amorosidade. Trata-se de ler o mundo pelas duas óticas – a do Feminino e a do Masculino – ao mesmo tempo. Trata-se de reconhecer e respeitar as diferenças entre os gêneros, sem nos iludirmos de que são “opostos” e “incompatíveis”, mas acolhendo-os como complementares e indissociáveis!
Rio de Janeiro, 21.11.17
Dedicado a Catita, Sasha e Joana