Seminário discute caminhos para a construção de modelo(s) energético(s) baseados na justiça socioambiental

Foto: Renato Rolin/FotosPúblicas

Por Paulo Victor Melo | Especial para JSB

Onde estamos na história? Como estamos caminhando para o futuro digital? Para onde estamos indo? Essas foram algumas perguntas-provocações feitas pela pesquisadora Camila Moreno, da Humboldt University/Alemanha, durante o primeiro dia de atividades do Seminário Soberania e Integração Elétrica Regional – Modelo Energético Atual: Desenvolvimento para quem e para quê?, organizado por um conjunto de entidades brasileiras e paraguaias entre os dias 24 e 26 de novembro de 2021, entre as quais as redes Jubileu Sul Brasil e Jubileu Sul/Américas.

Ao apresentar os questionamentos, Camila ressaltou que “estamos vivendo uma mudança de época, em que se desenha uma ordem mundial pós-covid”, sendo uma das principais transformações a eletrificação como elemento estruturante e a digitalização na educação, no trabalho, na saúde, indústria, agricultura, dentre outros setores da economia e da vida social.

Oscar Rivas dividiu a análise de conjuntura com Camila Morena, os dois fizeram a abordagem a partir da seguinte provocação: O modelo de desenvolvimento e a demanda de energia: quais são os desafios que temos hoje?

Também palestrante do Seminário, Oscar Rivas, da organização ambiental paraguaia Sobrevivência, chamou atenção para dois desafios destes tempos que ameaçam a vida: a crise climática e a crise energética.

De acordo com Rivas, “a maior causa destas crises é o nosso modelo de consumo de energia insustentável, que utiliza grades quantidades para o transporte e a produção (…) e as injustiças socioambientais causadas pelos países industrializados contra o Sul Global, que aumentam cada dia mais”.

Na mesma perspectiva, a boliviana Tania Ricaldi, do Grupo de Trabalho Cambio Climático y Justicia, salientou que o “sistema energético convencional é subordinado, funcional a esse modelo de desenvolvimento, portanto um sistema perverso, excludente e inequitativo”.

Algumas das características/consequências deste sistema energético convencional, apontadas por Ricaldi, são: o aprofundamento das lógicas extrativistas e neoextrativistas; a mercantilização da energia; concentração da propriedade, do poder e da riqueza; ênfase na exportação energética; lógica rentista; conflitos socioambientais; impactos em territórios e populações tradicionais; exclusão da participação social na gestão e governança da energia.

Este contexto, para Ricaldi, “tem levado a um esgotamento do paradigma civilizatório, que é de destruição da vida (…) em que estão sendo minadas as capacidades da sociedade de reproduzir as bases materiais e culturais que permitem cobrir as necessidades individuais e coletivas, de forma digna, justa e sustentável”.

Apresentação de Tania Ricaldi a partir do tema “Energia, meio ambiente e sociedade: Direito à eletricidade como um direito humano”.

Entendimento semelhante foi exposto por Roberto D’Araújo, do Instituto Ilumina, ao apresentar dados e gráficos que evidenciam uma experiência mercantilista brasileira no que diz respeito à produção energética.

“A mercantilização mal feita destruiu a capacidade de adoção de políticas públicas e deixamos que se disseminasse a ideia de que o capital privado pode solucionar nossos problemas seculares”, disse Roberto, defendendo que “não basta não privatizar, temos que reconstruir”.

Alternativas

Como saída para este cenário, Oscar Rivas acredita ser essencial a garantia do “direito das comunidades a escolher suas fontes de energia sustentáveis e desenvolver um nível de consumo altamente saudável; a necessidade de redução da emissão de gases; e que todas as pessoas repartam os bens comuns de forma equitativa, dentro dos níveis ecológicos”.

No mesmo sentido, Heitor Scalambrini, professor aposentado da Universidade Federal de Pernambuco, julga ser essencial a construção de “um modelo energético que promova inclusão social, justiça socioambiental e a repartição das riquezas geradas”.

O direito dos povos aos benefícios que provêm da energia e a integração popular enquanto mecanismo de resistência e construção de futuros diferentes foram algumas das medidas destacadas como necessárias por debatedores do Seminário, a exemplo de Victorio Oxilia, pesquisador da Universidad Nacional de Asunción/Paraguai, e Gonzalo Castelgrande, atual presidente da Agrupación de Funcionarios de la Administración Nacional de Usinas y Transmisiones Eléctricas (AUTE).

Tania Ricaldi, do Grupo de Trabalho Cambio Climático y Justicia, salientou que o sistema energético convencional é perverso, excludente e inequitativo.

De forma enfática, Tania Ricaldi defendeu a necessária transição energética de caráter popular, que passa por aspectos como a transformação da relação sociedade-natureza; a redistribuição do poder, com formas alternativas de gestão e governança da energia; a perspectiva da energia como um direito e não como mercadoria; a ressignificação da energia como bem comum; e uma abordagem da energia a partir da ética da vida e de processos justos e sustentáveis.

Já a economista Sandra Quintela, articuladora nacional da Rede Jubileu Sul Brasil, que fez a abertura do Seminário, frisou a importância de outras iniciativas de debate sobre a questão energética, de modo que o tema “se torne acessível ao conjunto das pessoas, para que elas compreendam o que isso tem a ver com o seu cotidiano, com o seu dia a dia”.

Seminário reuniu participantes de forma presencial em Foz do Igauçu (PR) e online com pessoas de diversos países do Cone Sul

Realização

A realização do seminário é uma iniciativa conjunta entre Jubileu Sul/Américas, Jubileu Sul Brasil, Campaña Itaipu 2023 Causa Nacional, Coletivo Nacional dos Eletricitários, Confederación de la Clase Trabajadora – CCT (Paraguai), Federación de Trabajadores del Sector de la Energía de Paraguay (FETRASEP), Frente por uma Nova Política Energética para o Brasil, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Sindicato de Trabajadores de la Administración Nacional de Electricidad (SITRANDE-Paraguai), Sobrevivência – Amigos de la Tierra Paraguay, e a Sociedad de Comunicadores del Paraguay.

Os representantes do Jubileu Sul participam da atividade no âmbito da ação “Protagonismo da Sociedade Civil nas Politicas Macroeconômcas”, cofinanciado pela União Europeia.

Para ver as discussões do primeiro dia do Seminário, clique no ícone abaixo e visite o perfil do Facebook do Jubileu Sul Brasil.

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