“Vamos à luta pelos direitos não somente pelas indígenas, mas por todos os povos. Sofremos ameaças por sermos atrevidas e não vamos baixar nossas cabeças, esse movimento entre nós é uma fortaleza”, afirma Áurea, da etnia Anacé.

Acampamento Luta Pela Vida, agosto de 2021. Foto: Cícero Bezerra/Cimi

Por Marcos Vinicius dos Santos*

Mais de 7 mil mulheres indígenas de todos os estados brasileiros estarão em Brasília (DF) na luta pela defesa da vida e dos seus territórios. Esta será a II Marcha das Mulheres Indígenas. Neste ano o tema que vai pautar este grande momento é “Mulheres originárias reflorestando mentes para a cura da Terra”, a programação prevista acontece de 7 a 11 de setembro de 2021.

Na semana em que se celebra a memória da Independência do Brasil, as mulheres indígenas devem se juntar ao acampamento “Luta pela Vida”, que tinha a duração prevista de 22 a 28 de agosto, mas segue em Brasília (DF) aguardando o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o marco temporal (PL 490).

O projeto de lei, que tem sido conhecido como PL da morte, é visto pelos indígenas como um dos mais importantes da história recente, na medida em que atua diretamente sobre a distribuição de terras e preservação da tradição dos povos originários.

A luta é de todas as mulheres

A Marcha marca o fortalecimento da luta das mulheres indígenas, relembrando as conquistas das suas antepassadas e buscando resistir à retirada de direitos das mulheres indígenas e de todas as mulheres do país. Em reunião da Rede Jubileu Sul Brasil para articular a viagem de mulheres indígenas de São Paulo e Fortaleza, Juliana, Cacique Irê da etnia Jenipapo-Kanindé, do Ceará, lembrou as diferentes reivindicações das mulheres indígenas.

“Estamos lutando para que as leis saiam do papel, temos a lei da Diana Pitaguary, que é fruto do PL Nº 17.041 de 10 de outubro de 2019, aqui no Ceará. Queremos expandir essa experiência e ainda alterar a Lei Maria da Penha, de modo que ela se aplique também a nós indígenas. É todo esse conjunto que nos faz ir à Brasília (DF)”, disse Juliana.

Reunião por videoconferência da Rede Jubileu Sul Brasil em preparação da 2ª Marcha das Mulheres Indígenas

Diana Pitaguary, de 27 anos, também conhecida como Rosiane Dantas, foi assassinada por seu companheiro na madrugada do dia 7 de agosto, em 2017. O crime de feminicídio deixou a todas chocadas e inspirou a criação da Lei Nº 17.041. O fato deu início à Semana Diana Pitaguary, que hoje é realizada na primeira semana do mês de agosto, em todas as escolas indígenas do Ceará e faz parte do calendário de eventos do estado. O principal objetivo é debater com alunos e alunas o tema da violência contra a mulher, o feminicídio e a importunação sexual.

Também na reunião de preparação, Áurea, da etnia Anacé, do Ceará, reforçou a fala de Juliana lembrando que cada território está se organizando para enviar suas representantes. Elas concluíram que nesse momento é importantíssimo a parceria com projetos de apoio e a troca de experiências com comunidades de todo o país.

 “Vamos à luta pelos direitos não somente pelas indígenas, mas por todos os povos. Parece que a gente não consegue ter os direitos sem lutar, isso nossos antepassados nos ensinaram. Somos um grupo de território articulando e fortalecendo as mulheres, não somente por nós, para todas, o movimento traz uma garra muito grande e temos dentro de nós uma garra e uma espiritualidade, sofremos ameaças por sermos atrevidas e não vamos baixar nossas cabeças, e esse movimento entre nós é uma fortaleza”, explicou Áurea.

O desafio de organizar a marcha

A experiência da I Marcha das Mulheres Indígenas foi muito importante para o processo de organização e mobilização. Embora exista uma preocupação com a nova variante da Covid-19 em Brasília, a prevenção é apenas mais um desafio que elas estão dispostas a cumprir.

Agora, a II Marcha é símbolo da continuidade da luta iniciada no primeiro encontro e da busca por estabelecer mais laços como, por exemplo, com as etnias de contexto urbano, muitas desassistidas de infraestrutura e acesso a informações, o que dificulta o reestabelecimento de contatos. Essa é uma preocupação de Elane, da etnia dos Pankararu, em Franco da Rocha (SP), que se esforça para articular laços com outras mulheres indígenas do movimento.

 “Estou muito feliz, é a primeira vez que viverei essa experiência, e todo o apoio da Rede Jubileu está sendo muito importante para nós, e o povo do Jaraguá que está nos apoiando também e dando suporte, às vezes eu fico ansiosa, às vezes preocupada, mas quero contribuir nessa luta para fortalecer mais nossa comunidade. Vamos com o ônibus do Jaraguá – povo Guarani. E estou gostando de trocar ideias com o pessoal do Ceará e a possibilidade de aprender mais e mais, pois o desafio no contexto urbano é muito grande. Estar indo representar esse contexto em Brasília será muito importante”, afirmou Elane.

Apoiar as mulheres indígenas é um compromisso da Rede Jubileu Sul Brasil e suas organizações membro em diversas regiões do país estão envolvidas, trabalhando para facilitar essas trocas entre os povos e fortalecer territórios. Junto com as mulheres indígenas a Rede Jubileu e o Esplar – Centro de Pesquisa e Assessoria organizaram um informativo para distribuição durante a II Marcha das Mulheres Indígenas. O conteúdo reúne tanto os PLs que vão estar em debate no Congresso, como as pautas das mulheres, a partir dos diálogos conduzidos pela organização da Marcha e pelas experiências nos territórios.

A expectativa é de que a II Marcha das Mulheres Indígenas fortaleça ainda mais a grande manifestação que foi o primeiro encontro realizado em 2019 e contou com mais de 2 mil mulheres de 113 povos diferentes ocupando as ruas de Brasília. A Marcha não aconteceu no ano passado em virtude da pandemia de coronavírus.

A iniciativa da Rede Jubileu Sul Brasil com as mulheres conta com o apoio da Cafod e DKA.

*Com supervisão de Jucelene Rocha

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