Em reunião na capital paulista, representantes da Rede Jubileu Sul/Américas ressaltaram a importância da defesa e solidariedade ao Haiti na agenda prioritária da Jornada Continental pela Democracia e contra o Neoliberalismo.
Por Flaviana Serafim – Jubileu Sul Brasil
Representantes de organizações e movimentos populares da América Latina e Caribe participaram, neste dia 25, da reunião da Jornada Continental pela Democracia e contra o Neoliberalismo, realizada na sede da CUT Brasil, na capital paulista. Participam presencialmente representando a Rede Jubileu Sul/Américas (JS/A) Rosilene Wansetto, secretária executiva do Jubileu Sul Brasil, Beverly Keene, do Diálogo 2000 (Argentina), e virtualmente Martha Flores, secretária regional do JS/A.
Entre os pontos principais da pauta, a conjuntura regional e global, atualização da agenda, o trabalho político, iniciativas e avanços dos processos da Jornada, integração e soberania dos povos, além da definição de propostas de ação diante de diferentes lutas, entre as quais o embate frente às empresas transnacionais e ao acordo União Europeia-Mercosul.
O encontro foi iniciado com uma recapitulação da agenda em defesa da democracia e da soberania diante da atual conjuntura regional e global, marcada pelo avanço da extrema direita e por conflitos bélicos, e de reafirmar compromissos frente a este cenário.
Defesa e solidariedade ao Haiti
Beverly Keene e Rosilene Wansetto ressaltaram a relevância de que a Jornada inclua em sua agenda de lutas ações em defesa e solidariedade ao Haiti. Há anos o país tem enfrentado múltiplas crises (fome, crise humanitária, intervenção militar, instabilidade político-econômica e institucional), que se aprofundaram ainda mais desde o início de março, com a fuga de detentos após ataque a uma penitenciária e a renúncia do primeiro-ministro Ariel Henry.
Beverly Keene recordou que neste 1º de junho se completam 20 anos da Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti (MINUSTAH), e que há um consenso entre as organizações do país e aliadas no sentido de avaliar os impactos das intervenções visando reparação ao povo haitiano.
Segundo a liderança do Diálogo 2000, é importante uma agenda de solidariedade ao Haiti especialmente das organizações e movimentos da América Latina e Caribe “porque quase todos os nossos países estiveram envolvidos nessa intervenção militar, e nas decisões que foram ou serão tomadas por nossa região quanto à nova intervenção”. Beverly também recordou que, entre os desafios apontados durante a Jornada Latino-americana e Caribenha de Integração dos Povos, realizada em fevereiro, em Foz do Iguaçu, estão pautar na agenda de lutas a dívida com os povos indígenas da região e com o povo negro, no ensejo da Década Internacional de Afrodescendentes, que se encerra neste 2024.
“Vai haver várias atividades no âmbito da Década Internacional de Afrodescentes, muitas com a presença do Haiti e a questão da reparação da dívida paga pelo país à França pela Independência haitiana. Há uma série de questões, mas, mesmo com as dificuldades organizativas e os limites que temos, a dívida com o Haiti e com os povos originários de nossa região são relevantes e é preciso ver como encaramos isso e incluímos em nossa agenda”, pontuou.
No caso do Haiti, a Independência, conquistada há 220 anos pela revolta do povo negro escravizado, vítima de toda espécie de barbárie pelos colonizadores, também teve um custo financeiro: uma indenização à França, de 150 milhões de francos em ouro, cerca de US$ 21 bilhões atualmente, que levaram o Haiti a tomar empréstimos com juros altos em bancos franceses, americanos e alemães, mergulhando o país caribenho numa dívida que só terminou de ser paga em 1947. Por isso, hoje um grupo de organizações cobra, junto ao Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Afrodescendentes, reparação histórica e a devolução do dinheiro pago à França.
Transnacionais e direitos humanos
Na sequência, houve uma avaliação dos avanços e iniciativas do período. A incidência política conjunta pela aprovação de um Tratado Vinculante sobre empresas transnacionais e direitos humanos na ONU também pautou a agenda da manhã. A iniciativa, defendida pela Amigos da Terra América Latina e Caribe (ATALC), é por instrumento internacional juridicamente vinculativo para transnacionais em matéria de direitos humanos, como forma de lutar contra o poder empresarial corporativo e contra a impunidade das corporações que praticam inúmeras violações contra povos e territórios, mesmo com certificações e relatórios de sustentabilidade.
A proposta do tratado integra a Campanha Global para Recuperar a Soberania dos Povos, Desmantelar o Poder Corporativo e Acabar com a Impunidade, que ressalta a importância de inverter a lógica do lucro sobre a vida, afirmando a primazia dos direitos humanos frentes aos acordos comerciais, investimentos e ao direito econômicos.
No período da tarde, a reunião foi retomada com diálogo sobre feminismo popular e o trabalho da Escola Internacional para Organização Feminista Berta Cáceres, que foi criada em março de 2021 para contribuir nos processos de construção, partilha de experiências e de práticas de resistência e fortalecimento. Martha Flores, da secretaria do Jubileu Sul/Américas, tem acompanhado a escola e participado ativamente nesta construção, especialmente as organizações da Rede na Mesoamérica.
Mobilização social para o G20
Da secretaria executiva do Jubileu Sul Brasil, Rosilene Wansetto fez uma análise crítica sobre os espaços formais existentes no G20, nos quais organizações da sociedade civil e dos movimentos sociais tentam influenciar na elaboração dos documentos que vão subsidiar as decisões da Cúpula do Grupo das 20 maiores economias globais, que ocorre nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro.
Ela explicou que o encaminhamento é por uma Cúpula dos Povos, que vai se realizar em paralelo ao G20 Social, a exemplo da realizada na Rio+20, em 2012. Segundo Wansetto, está previsto um seminário para maio visando à organização da mobilização que vai se realizar antes da Cúpula de Líderes do G20.
“A Rede Jubileu Sul Brasil está planejando e construindo atividades paralelas, como um tribunal da dívida, no ensejo da campanha ‘Fora FMI/Banco Mundial – 80 anos de miséria, devastação de dívidas”. Ainda segundo a secretária executiva da Rede, organizações também pretendem realizar um encontro de mulheres para visibilizar a questão de gênero numa perspectiva diferente da que está em debate na programação oficial do G20.
A reunião foi concluída com propostas de ação, debate sobre como será a continuidade e a agenda da Jornada Latino-americana e Caribenha de Integração dos Povos.
Além da rede Jubileu Sul/Américas, participaram representantes da Amigos da Terra América Latina e Caribe (ATALC), Capítulo Cubano de Movimientos Sociales, Central Única dos Trabalhadores e Trabalhadoras (CUT Brasil), Confederação Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Américas (CSA) e da Marcha Mundial de Mulheres.