Luta contra a reintegração movida pelo Ministério Público Federal se arrastava desde 2018. Acordo mediado pelas Defensorias estadual e da União vai beneficiar cerca de 2.400 famílias da ocupação – a maioria indígenas -, abrindo caminho para regularização da terra e políticas públicas para a comunidade. Conquista é resultado de uma mobilização conjunta, que, entre outras organizações, contou com apoio da Rede Jubileu Sul Brasil, por meio da Ação “Mulheres por reparação de dívidas sociais”.
Por Flaviana Serafim – Jubileu Sul Brasil
Cerca de 2.400 famílias, a maioria indígenas, conquistaram o direito de permanecer na ocupação Nova Vida, no bairro Cidade Nova, na zona norte de Manaus (AM). A conquista é resultado de uma luta da comunidade, num esforço conjunto que contou com apoio do Fórum Amazonense de Reforma Urbana, da Campanha Despejo Zero e da Rede Jubileu Sul Brasil, por meio da Ação “Mulheres por reparação das dívidas sociais”. A medida abre caminho para a regularização da terra e, com ela, a implementação de políticas públicas como saúde, educação e mobilidade.
O embate da comunidade se arrastava há anos contra uma ação civil pública de reintegração de posse movida em setembro de 2018 pelo Ministério Público Federal (MPF), que buscava a retirada das famílias alegando que a ocupação se formou numa área pertencente ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), na qual se está o sítio arqueológico Cemitério dos Índios.
No último dia 24 de março, com mediação da Defensoria Pública da União e estadual, foi consensuado que o Museu da Amazônia (MUSA) vai fazer a retirada e a guarda das urnas funerárias de forma gratuita. Será elaborado um projeto com aprovação do IPHAN e definido um cronograma para retirada dos artefatos arqueológicos.
“Com a ação que deliberou a queda da reintegração de posse, vamos agora nos reunir, a partir do Fórum da Reforma Urbana e da Ação Mulheres, para acompanhar a comunidade e para que haja o levantamento dos resquícios arqueológicos que ainda existem na área, e a comunidade vai ajudar. Esse exercício é fruto do processo da cartografia que fizemos junto com a comunidade. Andamos pelas ruas, mapeamos a comunidades toda e onde esses resíduos poderiam estar, e isso vai subsidiar o antropólogo do Museu da Amazônia que vai coordenar um relatório técnico”, explica Marcela Vieira, articuladora local da Ação Mulheres que é realizada em Manaus numa parceria com a Cáritas Arquidiocesana.
“Esse relatório tem que ser preparado por um profissional da área de arqueologia e vai ser anexado aos autos dessa derrubada da reintegração de posse, no qual o IPHAN abre mão de atuar na retirada das famílias junto com o MPF porque os artefatos arqueológicos serão removidos e ficarão de posse do Museu da Amazônia. Esse relatório técnico tem que ser feito para concluir e findar o processo de reintegração”, completa a articuladora.
Ação e mobilização conjunta pela comunidade Nova Vida
Marcela destaca a importância da assessoria jurídica contratada pela Ação Mulheres em Manaus para que as famílias pudessem finalmente conquistar o direito à terra, que resultou na abertura do processo e abertura de diálogo. A retomada do acompanhamento do processo permitiu que a comunidade fosse à Defensoria Público e, com a missão realizada pela Campanha Despejo Zero em 2022, foi aberta uma mesa de negociação.
“Apresentamos novamente a situação da comunidade e com o desdobramento começamos o diálogo mais focado com o MPF e com o IPHAN, mediado pela Defensoria Pública para que, de fato, fosse feito uma reavaliação do processo, considerando que a comunidade estava em posse do lugar. Foi a partir da Ação ‘Mulheres por reparação das dívidas sociais’, da nossa assessoria jurídica, que conseguimos desencadear e chegar nessa conquista”, afirma Marcela.
Ainda segundo a articuladora, antes da Ação Mulheres, o Fórum Amazonense de Reforma Urbana estava desarticulado, e foi a partir do movimento contra a reintegração que começou a mobilização para que o Fórum voltasse a se reunir por ser um espaço de construção coletiva de políticas de moradia e de direitos para a população que vive nas áreas de ocupação.
“A Ação Mulheres incide inquietando as entidades e, ao mesmo tempo, criando esse link com a comunidade porque levamos computador, apresentamos, mostramos, depois levamos à Defensoria Pública para dialogar com as famílias. Foi graças à atuação em conjunto da Rede Jubileu Sul Brasil, o Fórum e a Habitat para a Humanidade Brasil”, conclui.
As iniciativas da Ação Mulheres por reparação das dívidas sociais ocorrem numa parceria entre o Jubileu Sul Brasil, 6ª Semana Social Brasileira (SSB) e Central de Movimentos Populares (CMP), com apoio do Ministério das Relações Exteriores Alemão, que garantiu ao Instituto de Relações Exteriores (IFA) recursos para implementação do Programa de Financiamentos Zivik (Zivik Funding Program). Também integram o processo de fortalecimento da Rede Jubileu Sul Brasil e das suas organizações membro, contando ainda com apoios da Cafod, DKA, e cofinanciamento da União Europeia.
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