Com o lema “Não Me Julgue Antes de Me Conhecer”, evento em São Paulo reuniu representantes das edições regionais do torneio que mobiliza refugiados desde 2014
Por Amanda Louise | MigraMundo
Depois de reunir cerca de mil refugiados, imigrantes e brasileiros ao longo das edições regionais, o Estádio do Pacaembu, em São Paulo, recebeu na última terça-feira (20) a final da etapa nacional da Copa dos Refugiados.
O evento, organizado pela ONG África do Coração em parceria com o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), reuniu os campeões ou representantes das edições de Porto Alegre (Líbano), Rio de Janeiro (Angola) e São Paulo (Níger), além do Futebol Clube Malaika, uma equipe sub-20 formada por refugiados de diferentes nacionalidades – em suaíli, idioma comum em parte da África, Malaika significa “Anjos”.
Ao todo, considerando as etapas regionais, foram 41 seleções com pessoas de 27 nacionalidades que disputaram a Copa neste ano, cujo lema foi “Não Me Julgue Antes de Me Conhecer” – que também estará na Marcha dos Imigrantes, marcada para 2 de dezembro.
No último jogo da Copa, Angola e Futebol Clube Malaika disputaram o título. Para chegarem à final, os campeões da etapa carioca precisaram dos pênaltis para superar o Níger, enquanto o time Malaika venceu o Líbano por 3 a 0.
A exemplo de edições anteriores, a partida de 20 de novembro foi marcada por fortes emoções, com manifestações dos presentes nas arquibancadas a cada drible. Depois de Malaika conseguir um gol no final do segundo tempo, os angolanos conseguiram o empate no último lance do jogo, que foi decidido nos pênaltis. E os jovens do Malaika ficaram com o título inédito por 4 a 2.
Com início em 2014, a expectativa é que a competição seja cada vez melhor, numa reunião que vai além de bolas na rede, em prol de uma causa humanitária. “Nossa expectativa do Brasil, que o governo brasileiro e o povo brasileiro reconheçam nossa chegada aqui, não discrimine e ajude para se manter esta vida. Porque precisamos desse apoio especial”, conta o sírio Abdulbaset Jarour, coordenador da Copa e vice-presidente da ONG África do Coração. Ele explica que essa é a maior felicidade e diversão de refugiados e migrantes: levantar a bandeira de seus países de origem e dos estados brasileiros em que vivem.
Foi o que Julson Luwawa, que reside no Rio de Janeiro e liderou a equipe angolana em sua primeira participação no campeonato. Luwawa não jogava futebol profissionalmente em Angola, e não tinha noção da grandiosidade que seria participar de um campeonato como o da Copa dos Refugiados – ainda mais no Estádio do Pacaembu, que já recebeu jogos profissionais históricos. “Ideia é participar das edições futuras”, afirmou o jogador.
“O evento mostra a capacidade deles de se organizarem, de identificar as próprias necessidades, de interagir em rede e de conseguir articulações nesse nível. Juntando em São Paulo prefeito, Secretarias e organismos internacionais e autoridades diversas num só lugar para prestigiar”, expõe Maria Beatriz Nogueira, chefe do escritório da ACNUR em São Paulo. Ela ainda enfatiza que os talentos dos refugiados são infindáveis, além das habilidades esportivas apresentadas nos últimos dias da competição.
Chegar ao final do ano não foi fácil. Uma das dificuldades veio após uma empresa que financiaria os uniformes das equipes declinar do patrocínio, fazendo a Secretaria de Esportes e Cultura solicitar orçamento emergencial à prefeitura da capital paulista. Mesmo assim, a Copa dos Refugiados deste ano chegou ao fim e já anunciou a sede da edição nacional de 2019: o Rio de Janeiro.
Do Pacaembu para o Corinthians
A vitória do Futebol Clube Malaika não foi o único motivo para fazer Conda Yacouba sorrir. O garoto de apenas 18 anos, conhecido como Pipoca recebeu um convite para participar de testes e compor a equipe de futebol 7 do Corinthians. Nascido na Guiné-Conacri, o jovem está no Brasil há pouco mais de um ano e não acreditou quando ouviu o chamado que esperava há três meses do time paulista. “Estou sem palavras”, expressou com um sorriso que cobria seu rosto.
Sobre o que esse convite representa para as pessoas que estão em situação de refúgio, disse sentir-se uma chave: “Tem jogador que sabe jogar mais que eu, mas que não tem oportunidade. Acho que tenho muita coisa para fazer para abrir a porta para os outros. Eu vou passar, mas tem que passar outra pessoa também depois de mim”.