Encontro de planejamento com as equipes locais da Ação Mulheres e Dívidas Sociais, da Rede Jubileu Sul Brasil, ocorreu de 23 a 25 de maio, na capital paulista, para avaliação, troca de experiências e organização das atividades prioritárias com mulheres. Em 2022, ações contra a dívida na perspectiva das mulheres serão realizadas em Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE), Macaé (RJ), Manaus (AM), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e São Paulo (SP).
Por Flaviana Serafim I Jubileu Sul Brasil
A Rede Jubileu Sul Brasil (JSB) realizou presencialmente, entre os dias 23 e 25 de maio, na capital paulista, o “Encontro de planejamento com as equipes locais” da ação mulheres e Dívida Social, um dos eixos prioritários do trabalho da rede, reunindo 23 participantes de todas as regiões do país.
Entre outros objetivos, a atividade foi um momento de avaliação e troca de experiências das ações que foram realizadas em 2021, e de compartilhamento dos planejamentos locais dos novos territórios onde a ação com mulheres começa em 2022. Antes do início do planejamento, as articuladoras locais e assessoras técnicas participaram da reunião da coordenação da Rede, realizada de 19 a 22 de maio (saiba mais sobre o encontro).
Após a acolhida e mística de abertura, no primeiro dia do encontro a articuladora nacional do Jubileu Sul Brasil, Sandra Quintela, fez um breve resgate histórico sobre o surgimento da Rede, que nasceu a partir dos processos articulados em torno da 3ª Semana Social Brasileira, simpósio, tribunais e o plebiscito sobre a dívida externa, realizado no final dos anos 1990 e ano 2000, com ampla mobilização.
Partindo deste marco, ela fez memória sobre o processo de formação da Rede com entidades membro, organizações e movimentos populares que formam a membresia da Rede Jubileu Sul Brasil, passando pela atuação do JS B contra as dívidas, entre as quais as geradas por megaeventos como a Copa em 2014 e as Olimpíadas de 2010, além do surgimento da Coletiva de Mulheres em 2017 e o engajamento na luta por moradia, como reparação a esta dívida social, que em 2021 culminou na ação Sinergia Popular de prevenção e mediação de conflitos urbanos no Brasil realizado em parceria com entidades membro.
“O que queremos é principalmente fortalecer a luta das mulheres por moradia, e fazendo a crítica a essa dívida social e à falta de recursos para investimento na área”, afirma Sandra Quintela.
A secretária executiva do Jubileu Sul Brasil, Rosilene Wansetto pontuou: “Como trabalhar mais fortemente a dívida social com o elemento do direito à moradia? Até então, atuávamos em várias frentes ligadas à luta por moradia, mas de forma espraiada no trabalho com mulheres. A partir da definição de prioridades, com a experiência acumulada foi definida uma ação mais específica, um eixo de trabalho prioritário na Rede sobre a questão da dívida, na perspectiva formativa e organizativa das mulheres”.
Rosilene afirma que “destaca-se o aspecto de que a Rede busca somar, criar sinergias com outras organizações de mulheres e da luta por moradia para fortalecer as ações por este direito fundamental que afeta milhões de famílias, às quais em sua maioria são mantidas por mulheres”.
Confira as imagens da reunião no Flickr do Jubileu Sul Brasil.
Mudar a sociedade, participando sem medo de ser mulher
As articuladoras Gorete Gama (Rio de Janeiro), Marcela Vieira (Manaus) e Nenzinha Ferreira (Fortaleza) fizeram um balanço da ação com mulheres em seus territórios em 2021, apresentando as características das centenas de famílias impactadas nas ocupações, os desafios e resultados alcançados.
Entre os principais legados estão a formação de lideranças e a ampliação da organização mesmo em meio à pandemia com a utilização de ferramentas de reuniões online. Nesse sentido, o apoio técnico às plataformas, o fornecimento de acesso à internet e de material de proteção e higiene foram essenciais para a realização da ação com as mulheres.
“Houve sim um avanço na organização das mulheres. É um processo lento até por conta da questão do machismo cerceando as lideranças, mas houve avanços, como o de mulheres que voltaram a estudar. Vemos a vontade e o desejo delas serem protagonistas da própria história”, destacou Gorete.
Segundo a articuladora, a incidência sobre os governos locais também avançou, com debate de projetos de lei sobre o tema na prefeitura e Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a exemplo da instalação de uma mesa de negociação com o Ministério Público para tratar de projetos de moradia social na região portuária da cidade.
Para Marcela Vieira, em Manaus, “a ação abriu caminhos na formação, mas foi principalmente um processo de formação para dentro, de sororidade entre as mulheres. A organização delas se tornou mais forte, com a formação de um coletivo de mulheres na associação de moradores no caso da ocupação Coliseu 3”. A articuladora destacou o crescimento da presença indígena nas ocupações, com essa população obrigada a sair de seus municípios rumo à capital amazonense devido às dificuldades de sobrevivência agravadas pela conjuntura do país.
“Quem faz o cotidiano da luta na comunidade são as mulheres. Quando a ação chega não é que os homens não sejam importantes para a luta, mas demos a vez a quem é de direito. Nosso plano de ação é amplo porque a luta por moradia não é pelo teto acima de nós, mas também em outras dimensões pelo direito à cidade, como ao transporte, à acessibilidade, entre outros”, disse Nenzinha Ferreira sobre a atuação nas comunidades de Fortaleza.
Novos territórios em ação
Na manhã do segundo dia, as articuladoras e assessoras técnicas apresentaram, por meio de fotos e informações, o contexto e a realidade das ocupações nos novos territórios da ação com mulheres, que neste ano de 2022 contempla também as cidades de Belo Horizonte, Macaé, Porto Alegre, Salvador e São Paulo. Para além da centralidade da defesa da moradia e do enfrentamento à especulação imobiliária, a questão da segurança foi uma das preocupações expressadas pelas articuladoras.
No período da tarde, Rosilene Wansetto apresentou a ementa detalhada dos itens que compõem a ação, tais como formação, planos de resposta aos impactos gerados por conflitos urbanos, mediação e incidência com atores envolvidos nos conflitos, os núcleos de comunicação popular e a comunicação institucional, o fortalecimento da organização das mulheres e das juventudes, as iniciativas de geração de renda e ações sobre a dívida pública e orçamento público.
Além das orientações gerais, outra pauta foi a intencionalidade política da ação com os diferentes públicos envolvidos. A ação inclui o debate sobre o feminismo comunitário, como reparação da dívida histórica com as mulheres, a partir da consolidação social do tripé patriarcado, machismo e racismo estrutural. Mesmo que a prioridade nesta ação sejam as mulheres, a intencionalidade é promover esse o debate sobre o feminismo comunitário envolvendo o público misto, para alcançar as mudanças que devem ocorrer a partir de dentro das famílias, nas organizações sociais e na sociedade em geral.
Na sequência, as articuladoras partilharam os planejamentos locais realizados anteriormente ao encontro presencial e o cronograma anual previsto para as atividades em cada território.
Formação e processos de comunicação
No terceiro e último dia do encontro, Alessandra Miranda, secretária executiva da 6ª Semana Social Brasileira (SSB), abriu os trabalhos apresentando os eixos prioritários para as oficinas e seminários de formação programados para 2022. Ela apresentou os conteúdos produzidos em 2021, como as cartilhas Direito à moradia e à cidade, Sobreviver na pandemia: moradia, renda e comida no prato e Conflitos e Regularização Fundiária: Vamos fazer resistência popular?, e fez um resgate dos processos pedagógicos e da metodologia que vem sendo utilizadas.
A coordenadora da comunicação da Rede JSB, Jucelene Rocha dialogou com as participantes sobre as estratégias de comunicação e visibilidade da ação com mulheres e dívidas sociais no âmbito nacional e territorial, e sobre cuidados nos registros, seja quanto aos direitos autorais, como o respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente, entre outras legislações.
Um dos objetivos no campo da comunicação é fortalecer coletivos de comunicação nos territórios e incentivar a criação desse espaço onde ainda não houver uma organização inicial. Os caminhos e processos para criação dos coletivos de comunicação e para produção de conteúdos serão detalhados posteriormente à reunião, a partir de uma construção coletiva envolvendo toda a equipe da ação com as mulheres.
Ao final, foi feita uma avaliação coletiva do encontro, encerrado com uma grande ciranda que ressaltou a importância da unidade, do apoio mútuo e da atuação individual em prol do resultado coletivo para o conjunto das ações.
A iniciativa ocorre numa parceria entre o Jubileu Sul Brasil e as entidades membro (Pastorais Sociais/SSB e a Central de Movimentos Populares/CMP, com apoio do Ministério das Relações Exteriores Alemão, que garantiu ao Instituto de Relações Exteriores (IFA) recursos para implementação do Programa de Financiamentos Zivik (Zivik Funding Program).
As ações, que também integram o processo de fortalecimento da Rede Jubileu Sul Brasil e das suas organizações membro, contam ainda com apoios da Cafod, DKA, e cofinanciamento da União Europeia.