O articulador do Cone Sul Francisco Vladimir no FOSPA 2022

Por Flaviana Serafim – Jubileu Sul Brasil

A Rede Jubileu Sul Brasil participou do Fórum Social Pan-Amazônico (Fospa), realizado entre os dias 28 e 31 de julho em Belém (PA). A Rede esteve presente tanto nos debates e mobilizações quanto na organização de atividades, representada por Francisco Vladimir, articulador do Cone Sul que nesta entrevista faz seu relato sobre as vivências e partilhas no Fospa.  

O articulador também comenta de que forma as mobilizações e o encontro no FOSPA se conectam à campanha por Justiça Socioecológica promovida pela Rede Jubileu Sul/Américas, e ainda os impactos do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia na vida dos povos amazônicos. 

O encontro reuniu centenas de movimentos, articulações e povos de toda a Pan-Amazônia, que é composta por nove países (Brasil, Venezuela, Peru, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa e Suriname). 

Representando as Redes Jubileu Sul Brasil e Jubileu Sul/Américas no Fospa também participaram das atividades Luís Fernando Novoa Garzon, professor da Universidade Federal de Rondônia (UNIR), e Joilson Costa, Coordenador Executivo da Frente por uma Nova Política Energética para o Brasil. 

Além da entrevista, no final do texto confira também um vídeo do articulador sobre o Fórum.

Quais os objetivos do FOSPA? 

É um espaço de articulação dos povos e movimentos sociais para a incidência e a resistência política e cultural frente ao modelo de desenvolvimento neoliberal, neocolonial, extrativista, discriminador, racista e patriarcal. É um evento, um processo que traz lutadoras e lutadores pela vida, pela Amazônia e seus povos. É a união para o fortalecimento das resistências dos povos da Pan-Amazônia que constitui o sentido do Fórum Social Pan-Amazônico, o FOSPA.

Em todos os países da Pan-Amazônia segue em curso uma luta secular contra o colonialismo, o capitalismo, o racismo, o patriarcado, o extrativismo e tantas outras estruturas assimétricas e violentas de poder que vêm promovendo genocídio, etnocídio e ecocídio. 

Entre os dias 28 e 31 de julho de 2022, em Belém (PA), o FOSPA reuniu um conjunto de movimentos, articulações e povos de toda a Pan-Amazônia, composta por nove países: Brasil, Venezuela, Peru, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa e Suriname.

O FOSPA surgiu em 2001, também em Belém, com raiz a partir do acúmulo de troca de experiências no 2º Encontro pela Humanidade e contra o Neoliberalismo, em 1999, e logo depois, durante o 1º Fórum Social Mundial, sempre tendo como objetivo e ideia central do encontro a defesa da Amazônia e seus povos tradicionais.

E como isso se relaciona com a Rede Jubileu Sul/Américas, com a campanha por Justiça Socioecológica? 

A Rede, por meio de suas organizações, tem em seus eixos prioridade à luta pela defesa e justiça socioambiental, e das reparações sociais necessárias diante do acúmulo de omissões e negligências governamentais sobre os povos da Amazônia e da biodiversidade que compõe a floresta. Por tanto, estar em um momento como este do FOSPA nos fortalece em uma ampla articulação com movimentos sociais e organizações que também estão na mesma luta pela defesa dos territórios.

Nossa campanha por Justiça Socioecológica contribui com os processos de luta e resistência aos modelos extrativistas e seus impactos sobre os corpos e territórios, e para o reconhecimento da dívida ecológica numa perspectiva decolonial, anti-patriarcal e antirracista. E como dito anteriormente, busca fortalecer as vozes e narrativas de resistência, as ações, formas de luta e as propostas de alternativas, como nas comunidades locais, tradicionais e negras porque o modelo extrativista tem sua origem no patriarcado e no sistema capitalista. 

Sem justiça racial não haverá justiça ambiental, porque as atividades contaminantes afetam diretamente as comunidades afrodescendentes, indígenas e rurais. E é em nossa rede, em nossas ações territoriais, nacionais e internacionais, juntamente com várias organizações parceiras, que percebemos que por trás de cada conflito socioambiental existe um problema ligado às formas de produção e consumo.

É nesse sentido que buscamos ir além quando afirmamos que não é suficiente lutar por justiça socioambiental se a natureza é invisibilizada como sujeito, pois tem voz, deve ser ouvida e interpretada – e isso os povos originários sabem muito bem, temos muito que aprender com esses povos.  

O que se propõe é que essa luta transcenda a sociedade humana, incluindo os animais não humanos, a democracia com a terra, a justiça com os povos e a natureza, que supere o conceito de ambiente e da visão distributiva de riquezas.

Por tanto, a injustiça socioecológica é reflexo das dívidas pública, social, ecológica e histórica. Com liberação de megaprojetos e da militarização, por exemplo, problemas como esses perpetuam o domínio e exploração das pessoas, dos povos e da natureza. Por isso, temos a tarefa de exigir reparações porque não queremos trocas – que são uma enganação, apresentando o que não é viável para as comunidades –  e que também são falsas soluções. 

Exigimos que haja justiça socioecológica: o cuidado com o meio ambiente e com o clima. É necessário responder urgentemente à emergência socioambiental com a suspensão do pagamento e uma apuração abrangente da dívida, com repúdio e o não pagamento do que não devemos. É preciso exigir a punição dos responsáveis por essas dívidas criminosas ​​e a reparação dos verdadeiros crimes contra a humanidade e a natureza.

Queremos momentos como esse – de organização popular, de nossa ação diária como Rede Jubileu Sul, enfrentar o sistema capitalista patriarcal, global e institucionalizado, e caminhar rumo aos direitos coletivos dos povos, em conjunção e interdependência com os direitos da natureza. Há muita luta, muita resistência, há muita organização popular. Por isso continuamos nos somando, através das ações nos territórios das organizações que constroem as Redes Jubileu Sul Brasil e Jubileu Sul/Américas. 

Que impactos você destacaria sobre o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia na vida dos povos amazônicos?

Este acordo é planejado para legalizar, por meio de leis, a devastação do território brasileiro e toda a região amazônica, atualmente invadida por grupos criminosos e empresas internacionais, com a participação de grandes fazendeiros, com financiamento do capital financeiro, com total apoio do governo Bolsonaro e seus aliados, desde empresas, prefeituras aos ministérios. 

Se consolidado, será reduzida de forma imediata ou gradual as tarifas de importação entre países europeus e sul-americanos até reduzir os impostos a zero, facilitando ainda mais a entrada do capital estrangeiro que explora nossas terras desde a colonização.

O acordo tem um pilar puramente comercial e os elementos ditos de “proteção” aos direitos humanos e ambientais ficam em segundo plano. Terá impactos socioeconômicos, trabalhistas, fundiários, territoriais, ambientais e climáticos significativos para o Brasil e os demais países do Mercosul.

Visa também ao aprofundamento da desindustrialização, da reprimarização da economia, da evasão de divisas e a sonegação de impostos nos países do Mercosul. E seguramente aumentará a importação de produtos similares aos já produzidos no Brasil, gerando mais desemprego. Ademais, reforçará a competitividade perversa, na qual os ganhos que o agronegócio possa ter vão implicar em destruição ambiental, perdas para o setor industrial e para os direitos e renda dos trabalhadores e trabalhadoras, além de concentrar a produção em setores intensivos em uso de energia e água.

Dentre várias atividades autogestionadas no FOSPA, no dia 29 de julho participamos do “Curso Regional Acordo Mercosul-UE: o que a Amazônia tem com isso?”, realizado pela Frente Brasileira Contra os Acordos Mercosul União Europeia e EFTA-Mercosul.

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