Por Comunicação – Jubileu Sul/Américas, com tradução e edição do Jubileu Sul Brasil

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O crime sociecológico

No último dia 15 de janeiro, aconteceu um derramamento de 6.000 barris de petróleo na costa central do Peru, vazamento ocorrido durante uma operação de descarga da refinaria La Pampilla, da multinacional Repsol, petrolífera localizada em Ventanilla, distrito da província de El Callao, perto de Lima, capital peruana.

Foto Divulgação – Acervo Servindi.org

A Repsol, empresa espanhola responsável pelo derramamento, atribuiu o incidente às “ondas anômalas” produzidas após a erupção do vulcão subterrâneo em Tonga  (teleSUR, 2022). O Ministério das Relações Exteriores do Peru entrou com uma ação contra a Repsol pelos danos causados após o vazamento de óleo, e exigiu que as consequências do acidente sejam imediatamente compensadas.

“O derramamento de óleo da Repsol em Ventanilla é o pior desastre ecológico de Lima nos últimos tempos, e causou sérios danos a centenas de famílias de pescadores.  A Repsol deve compensar esse dano imediatamente”, informa o Ministério das Relações Exteriores na conta oficial no Twitter. O Ministério também ressaltou que essa situação colocou em risco o ecossistema de duas áreas protegidas: a Reserva Nacional do Sistema insular, ilhotas e Puntas Guaneras, Ilhotas dos Pescadores; e a zona de preservação de Ancón, na região de Lima.

Mortes de pássaros, leões marinhos e pinguins foram relatadas, assim como muitos animais contaminados.  O Ministério da Saúde identificou 21 praias afetadas pelo derramamento e muitos moradores das comunidades afetadas se deslocaram para o entorno da refinaria La Pampilla.

A Repsol Peru, por meio do gerente de Comunicação e Relações Institucionais, Tine van den Wall Bake Rodríguez, em entrevista à rádio peruana RPP em 19 de janeiro, afirmou que a companhia petrolífera não causou o desastre ecológico, que o vazamento foi consequência da emergência produzida pela erupção vulcânica em Tonga e acrescentou que a multinacional continuou a operar porque a Marinha peruana lhes disse que não havia aviso de tsunami.  A grande questão para a multinacional é onde está seu sistema de alerta de tsunami e derramamento de óleo? E para o Estado peruano, onde está o controle estatal sobre as empresas.

Quem é a Repsol

Para o Jubileu Sul/Américas, é de grande importância que possamos nos aprofundar sobre a multinacional, aqui estão alguns dados:

A Repsol S.A é uma empresa multinacional espanhola de energia e petroquímica, com sede em Madri. Sua origem remonta a 1987, quando o Instituto Nacional de Hidrocarbonetos (INH) criou o grupo Repsol S.A. como resultado da reorganização do setor energético espanhol.

Atualmente, a empresa está organizada em cinco subsidiárias, por meio das quais realiza suas principais atividades, que são: exploração, produção, transporte e refino de petróleo e gás.

A presença na América Latina foi uma de suas chaves para o crescimento, já que isso a tornou uma empresa privada líder na produção de hidrocarbonetos“.

A chegada ao Peru

A Repsol foi fundada no Peru em 1996, e suas principais atividades no país são:  produção de gás natural e líquidos associados, a partir de uma fábrica localizada na floresta amazônica, na região de Cuzco, e uma refinaria de petróleo chamada La Pampilla, que é a principal em nível nacional e uma das mais importantes da América Latina.

As falsas soluções

A Repsol tente se apresentar como uma empresa que tem um compromisso na luta contra as mudanças climáticas, que mesmo em 2018 incorporou eletricidade e gás natural de baixa emissão em sua oferta comercial como um passo na rota para transferência de energia“, operando em um negócio de baixa emissão.

A realidade é que, de acordo com o relatório Grandes Poluidores 2020 sobre descarbonização na Espanha e na Europa, publicado desde 2020 com base no monitoramento que é feito a partir do Observatório da Sustentabilidade (OS), a Repsol subiu um lugar e se tornou a empresa que emite mais gases de efeito estufa na Espanha, sendo responsável por 0,33% das emissões industriais de gases de efeito estufa globalmente e, portanto, um dos maiores contribuintes para as mudanças climáticas  (Mareca, 2021) Existem 10 empresas na  Espanha, com a Repsol à frente, que representam 56% das emissões de gases que prejudicam o clima.


Alerta das organizações da sociedade civil

Rosa Rivero, membro da Marcha Mundial das Mulheres Macronorte Peru, compartilha que não há dúvida de que a REPSOL É CULPADA, mas é preciso ressaltar que é responsabilidade do Estado controlar e fiscalizar que as empresas cumpram os marcos regulatórios, os sistemas de alerta precoce e planos de contingência para derramamentos de petróleo e tsunamis. Este crime socioecológico não pode ficar impune.

“Danos e perdas incalculáveis foram registrados, e seus impactos podem levar décadas, não serão resolvidos com medidas emergenciais e de curto prazo, bem como a poluição de rios e lagoas por atividades de mineração extrativista. Seguimos lutando e resistindo diante do extrativismo para que os contratos com as empresas extrativistas e seus operadores sejam revistos, para mudar as regras do jogo para os territórios e soberania, com uma nova Constituição política para o Peru”, afirma Rivero.

Da Marcha Mundial das Mulheres Macro Norte peruana, as mililtantes identificam que não é um desastre local, pois progressivamente o derramamento de óleo está se espalhando ao longo da costa peruana. Pescadores artesanais da costa norte do Peru permanecem em alerta para a ameaça da provável chegada da mancha de óleo em seus territórios.

Não há quantificação oficial dos imensos danos e perdas do desastre socioambiental, a INDECI informou que não há perdas de vidas humanas.

A Agência de Avaliação e Fiscalização Ambiental (OEFA), vinculada ao Ministério do Meio Ambiente peruano, informou que, até o momento, a área danificada é de 1 milhão e 739 mil metros quadrados e estimou que esse número poderia aumentar ao longo dos dias. Segundo a entidade, nove praias e duas reservas naturais protegidas foram afetadas, a Reserva Nacional do Sistema de Ilhas, de ilhotas, as Ilhas Guaneras e a Zona Reservada de Ancón. 

Para o MMM Macro Norte Peru, é importante apontar alguns impactos diretos:
– Impacto ao ecossistema do distrito de Ventanilla: à flora, fauna marinha e à cadeia alimentar marinha;
– Atividade de pesca artesanal está paralisada;
– Colapso dos meios de subsistência de homens e mulheres que enfrentam a Covid-19 e a pobreza realizando atividades econômicas nas praias, aproveitando a temporada de verão;
– Impacto no turismo.

Vazamentos de pretroleros são frequentes

Rosa Rivero relata ainda que o Governo Territorial Autônomo da Nação Wampis e o Povo Achuar de Pastaza, povos indígenas amazônicos peruanos, há alguns dias emitiram uma declaração para rejeitar a atividade petrolífera do Lote 64 localizado no distrito de Morona, Datem del Marañon, denunciando que a concessão está em seus territórios coletivos comunitários ancestrais.  Eles também apontam que derramamentos de óleo, como os ocorridos em Ventanilla, geram impactos negativos para a vida de todos os seres vivos e que esses vazamentos acontecem diariamente em seus povos.

Eles apontam que as regras que regem a indústria de hidrocarbonetos no Peru não oferecem garantias, e que continuam a ser uma ameaça à vida nos territórios indígenas. As atividades extrativistas são incompatíveis com o funcionamento da natureza e as aspirações de seus povos e gerações futuras: “somos testemunhas e vítimas dos impactos em nosso território que permanecem não mediados, e de impactos muito graves que ocorreram nas operações dos lotes 192 e 8 onde nossos irmãos de Achuar vivem na bacia do rio Corrientes, Quechua, Kichwa, Urarina e Kukama nos últimos 50 anos.”

De acordo com o relatório da Oxfam. de 1997 a 2021 houve 1002 derramamentos de óleo no país e apenas sete empresas foram responsáveis por 80% dos casos registrados. Quando a OEFA impôs multas, as empresas processam e deixam um vácuo na atenção e reparação, com os derramamentos permanecendo na impunidade.[1]

Referências

Agenda 2030. Disponível em: agenda2030.gob.es

Mareca, A. (2021). Disponível em: https://www.climatica.lamarea.com

Repsol, S.A. Disponível em: https://www.repsol.com/es/index.cshtml

teleSUR. (19 de janeiro de 2022). Disponível em: https://www.telesurtv.net


[1] https://www.facebook.com/NacionWampis/photos/a.1898317490383302/3055200161361690

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