De interesse da bancada ruralista, projeto não passou por audiência pública; oposição e movimentos criticam iniciativa

Cristiane Sampaio | Brasil de Fato 
Senadora Ana Amélia (PP-RS), integrante da bancada ruralista e autora do PLS 181/2018  - Créditos: Edilson Rodrigues/Agência Senado
Senadora Ana Amélia (PP-RS), integrante da bancada ruralista e autora do PLS 181/2018 / Edilson Rodrigues/Agência Senado
Foi aprovado, nesta quarta-feira (12), na Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado, um projeto que pode levar ao bloqueio de bens de militantes ou entidades relacionadas à luta social. É apenas uma entre várias tentativas de enquadrar e criminalizar movimentos populares sob o argumento de combate ao terrorismo e à violência.
O texto que passou hoje na CRE é o Projeto de Lei do Senado (PLS) 181/2018, de autoria da senadora Ana Amélia (PP-RS), da bancada ruralista, que permite a indisponibilidade de bens de pessoas acusadas ou investigadas por suposta prática de terrorismo.
A preocupação da sociedade civil organizada é de que essa proposta seja utilizada como via legal para a criminalização oficial de militantes.
O projeto, que tramita desde abril deste ano, foi aprovado na CRE sem que tenham sido promovidas audiências públicas para discutir a medida.
Para Alexandre Conceição, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a falta de debate sobre o tema faz parte da proposta política do PLS, o partido do presidente eleito, que se insere no contexto de criminalização crescente dos movimentos populares.
Ele destaca ainda que a aprovação célere dessa e de outras medidas que podem afetar os interesses sociais tem sido a marca dos últimos anos no Congresso Nacional.
“Mais uma vez, a sociedade é apunhalada pelas costas numa votação. Mais uma vez, ela não foi chamada pra dialogar sobre os rumos do país”, critica.
O MST e o Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) têm sido as entidades diretamente citadas por parlamentares e por Jair Bolsonaro (PSL), futuro presidente da República, como organizações que podem ser enquadradas como terroristas.
Os dois movimentos são referência na luta pela garantia dos direitos sociais e têm como prática a ocupação de prédios, terrenos improdutivos que devem ser encaminhados para a reforma agrária, entre outros.
PLS 181
A justificativa apresentada pela autora do projeto no texto do PLS 181 é de que a proposta teria o objetivo de fazer o Estado brasileiro cumprir sanções impostas por resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) em relação ao terrorismo.
O projeto foi aprovado na CRE em meio à ausência dos parlamentares da oposição, que não participaram da sessão do colegiado nesta quarta. A partir de agora, a proposta deverá ser encaminhada para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
Em entrevista ao Brasil de Fato, o líder da bancada do PT na Casa, Lindbergh Farias (PT-RJ), informou que irá pedir a rejeição da proposta na CCJ. Caso o texto principal do projeto seja aprovado, o grupo deverá, segundo ele, apresentar destaques, que são sugestões de alteração no texto.
A ideia do PT é retirar do projeto os trechos que permitem que o pedido de bloqueio de bens seja feito por autoridades brasileiras – no caso, por meio do Ministério da Justiça (MJ) – ou estrangeiras.
Os petistas deverão sugerir que o Senado mantenha o que já está previsto na legislação brasileira, que é o cumprimento de sanções impostas pelo CSNU quando houver um pedido do próprio Conselho.
Farias destaca ainda que o Brasil não tem histórico de casos de terrorismo e que, se for definitivamente aprovado, o PL poderá ser usado como manobra política contra movimentos populares.
Sérgio Moro   
O senador aponta ainda que a intenção dos que propõem o PLS 181 seria também dar superpoderes ao ex-juiz federal Sérgio Moro, futuro ministro da Justiça do governo Bolsonaro. Moro, que era responsável pelos processos da Operação Lava Jato em Curitiba (PR), tem feito articulações para garantir a aprovação de propostas que ampliem a Lei Antiterrorismo e outras legislações semelhantes.
O PLS 181/2018 prevê, por exemplo, que o bloqueio de bens de pessoas acusadas de terrorismo poderá ser efetivado pelo Ministério da Justiça (MJ), que, no novo governo, será responsável pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
O órgão atualmente é vinculado ao Ministério da Fazenda, mas será atingido pela reforma ministerial de Bolsonaro, já anunciada nas últimas semanas.
Com isso, caso o PLS 181 seja aprovado e vire lei, Moro poderá ter acesso às movimentações financeiras de cidadãos e entidades sem a necessidade de intermediação do Ministério Público Federal (MPF) e do Poder Judiciário para a visualização dos dados.
Lindbergh Farias considera que o Brasil pode estar caminhando para a instauração de um “Estado policial”, com excesso de prerrogativas para o Poder Executivo.
“É importante que as pessoas saibam o que está acontecendo, principalmente no Ministério Público, no Poder Judiciário e no STF, porque o que ele (Moro) está fazendo é usurpando atribuições do MP e do Judiciário. É como se o Moro dissesse ‘o Judiciário sou eu’”, criticou.

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