Instituições serão julgadas em audiências plurinacionais por violações de direitos humanos e da natureza. Tribunal popular inicia em Quito, Equador
Por Comunicação Jubileu Sul Brasil e Diálogo 2000
O Tribunal dos Povos e da Natureza contra o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (BM) foi lançado na manhã deste 15 de outubro, numa conferência de imprensa internacional como parte da campanha “Fora FMI-Banco Mundial: 80 anos de miséria, devastação e dívidas. Reparações já!”. A atividade também marcou o início da Semana Mundial de Ação pela Justiça Socioeconômica, Climática e da Dívida, que este ano acontece de 15 a 27 de outubro.
Sandra Gallo, representante do Conselho de Educação Popular da América Latina e do Caribe (CEAAL), um dos espaços que convocam a campanha, explicou que o Tribunal Popular se baseia numa série de audiências realizadas de forma plurinacional, descentralizada e autogestionada. “O FMI e o BM serão julgados pela sua responsabilidade e cumplicidade em políticas, programas e dívidas que causaram graves danos sociais, ambientais e econômicos, violando territórios e direitos das pessoas e da natureza, para dar voz e fortalecer as lutas para acabar com esta ação criminosa e conseguir reparação”, afirma.
As sessões do Tribunal começam em Quito, no Equador, neste 23 de outubro (assista clicando aqui), e seguem durante o ano de 2025, com a decisão final por um Júri Popular composto por pessoas de diversas origens, reconhecida experiência e representatividade. Entre as personalidades do Júri estão o ganhador do Prêmio Nobel argentino Adolfo Pérez Esquivel, a líder indígena equatoriana Blanca Chancosa, o líder popular haitiano Camille Chalmers, a ativista filipina Lidy Nacpil, o economista indiano C. P. Chandrasekhar, o sindicalista e líder político de Trinidad e Tobago David Abdulah, e a coordenadora do Conselho Cívico de Organizações Populares e Indígenas de Honduras (COPINH), Berta Zúñiga Cáceres.
Acesse o vídeo coletiva de imprensa clicando aqui ou assista no final do texto.
Primeiras audiências: povos indígenas, mulheres, colonialismo químico, megamineração, imperialismo e crise climática
Aurora Donoso, do Instituto de Estudos Ecológicos do Terceiro Mundo e da Acción Ecológica (Equador), membro da Rede Jubileu Sul/Américas que também convoca a campanha, falou sobre a primeira sessão do Tribunal que acontecerá no dia 23 de outubro em Quito e virtualmente. “Esta audiência tem uma importância especial já que foi realizada no Equador a primeira Auditoria Integral de Crédito Público, de caráter social e governamental com importantes conclusões que serão conhecidas.”, destacou.
Donoso, que fez parte da referida Auditoria oficial, acrescentou que serão apresentados nove depoimentos especializados e de comunidades afetadas, abordando os impactos sofridos, os processos de luta, demandas por reparação integral e justiça socioecológica.
Uma segunda audiência tem como foco nos agrotóxicos e no avanço do colonialismo químico, como explicou o deputado estadual Renato Roseno, membro do júri deste Tribunal Popular que será realizado em Fortaleza, Brasil, no dia 31 de outubro. A iniciativa é promovida pelo Esplar – Centro de Pesquisa e Assessoria, entidade membro da Rede Jubileu Sul Brasil.
“Venenos que até são proibidos no Norte Global são despejados no Sul Global, matando pessoas, biodiversidade, natureza. Isso gera dívidas para as pessoas, gera doenças como o câncer, morte da biodiversidade e das nossas culturas tradicionais, especialmente indígenas e quilombolas. é por isso que queremos colocar os pesticidas no banco dos réus, especialmente as corporações químicas e o colonialismo químico”, disse Roseno.
Também no Brasil, está prevista uma sessão no dia 15 de novembro, no Rio de Janeiro, durante a “Cúpula dos Povos contra o G20”, uma iniciativa autônoma e independente que reúne um conjunto de entidades, paralelamente ao programa oficial da Cúpula dos Líderes do G20 . Segundo Rosilene Wansetto, secretária executiva do Jubileu Sul Brasil, é um tribunal “para colocar o imperialismo no banco dos réus porque a intervenção do G20 não é só para as 20 maiores economias. As decisões influenciam e destroem os territórios de tantos outros países que não fazem parte deste grupo.”
Em Cajamarca, no Peru, a audiência está prevista para o final de novembro, com ênfase nas violações decorrentes do extrativismo das megamineradoras. Da Marcha Mundial das Mulheres Macronorte Peru, Lourdes Contreras afirmou:
“Estamos vivendo falsas soluções e transições geopolíticas em todo o mundo que estão intensificando a dívida, a pilhagem e a devastação da natureza dos nossos povos e territórios. Isso ataca sobretudo a continuidade histórica dos nossos povos indígenas e camponeses, uma vez que a presença continuada de golpes de estado e de ditaduras é para garantir a continuidade do sistema extrativista neoliberal, que é um novo colonizador além de patriarcal”.
Das Filipinas, Mae Buenaventura, do Movimento Ásia-Pacífico sobre Dívida e Desenvolvimento (The Asian Peoples’ Movement on Debt and Development – APMDD, na sigla em inglês) falou do tribunal que será realizado na capital, Manila, no dia 26 de outubro, onde as acusações contra o FMI e o Banco Mundial se concentram nos impactos causados pela crise climática e pela condicionalidades que restringiram o acesso das pessoas a serviços básicos essenciais.
Dívida históricas
David Abdulah, representante da Assembleia dos Povos do Caribe e do Movimento pela Justiça Social em Trinidad e Tobago, relembrou seu depoimento no Tribunal Popular Permanente contra o FMI e o BM, em Berlim, Alemanha, em 1988, quando denunciou ao FMI por violar a independência nacional do seu país. “Hoje, o Caribe de língua inglesa é uma das regiões mais endividadas do mundo. Por isso a questão da dívida, tanto financeira como socioecológica, é muito importante. Há também as dívidas históricas derivadas da escravidão e, mais tarde, da servidão e do genocídio dos primeiros povos, o que faz com que a questão das reparações seja muito central, especialmente no caso do Haiti.”
Por sua vez, a líder kichwa do Equador, Blanca Chancosa, enfatizou a continuidade dos crimes da colonização. “Para nós, indígenas, exigimos mesmo o pagamento da dívida histórica. Que tenham em conta que sofremos colonização, exploração desde 1492, mas também que continua até hoje na exploração que ainda está presente através dos governos. Oferecem grandes concessões para exploração, para mineração, petróleo e extrativismo madeireiro, sem consultar a população”, criticou. “E agora este roubo foi institucionalizado, através de um FMI e de um Banco Mundial que impõem condições aos governos, eles são intervenientes diretos nas políticas de cada um dos países.”
Porque participar do Tribunal
Tanto Chancosa quanto María Elena Saludas, de outros espaços de convocação, como o Comitê para a Abolição da Dívida Ilegítima e a Autoconvocação para a Suspensão do Pagamento e Investigação da Dívida, da Argentina, encerraram convidando para participar do Tribunal, organizar audiências que fortaleçam as lutas e resistências locais, bem como a sua articulação e projeção internacional.
“Lutamos para unir as nossas vozes com as vozes de outros países”, disse Chancosa, “e esperamos que, com o que possa sair deste Tribunal, procuremos novos mecanismos para nos fazermos respeitar, pelo direito à vida de todos os povos e nossa natureza.”
Saludas, ao comentar a experiência do Tribunal Popular da Dívida e do FMI na Argentina, ocorrido em plena pandemia, destacou uma das resoluções do julgamento, que pede “promover, a partir de movimentos e organizações populares, a criação de uma aliança de povos e países credores em consequência do sofrimento sofrido e dos pagamentos efetuados indevidamente, para que o sistema de dívida não condicione tão facilmente cada país.”
Para mais informações e entrevistas:
Comunicação – Campanha “Fora FMI-BM”
Flaviana Serafim (Português/Espanhol): +55 11 98835-4285 / 94531-7411
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