As sementes crioulas são sementes nativas que carregam a informação genética forjada pela própria natureza sem interferência humana. As mulheres campesinas dotadas de saberes descobriram há um tempo a importância de protegê-las e guardá-las para garantir o florescimento de espécies de frutas, legumes, grãos e temperos cobiçados pela fome insaciável da chamada agrogenética, que interfere e modifica a formação das sementes e o decorrente desenvolvimento dos frutos. “O agronegócio ameaça nossa vida duplamente. Por um lado, rouba as nossas terras, e por outro, quer nos obrigar a consumir alimentos cheios de agrotóxicos e transgênicos”, relata Bernadete Montesano, agricultora urbana, moradora da localidade Rio da Prata, Campo Grande, zona oeste do Rio de Janeiro. Berna, como é conhecida pelas companheiras, não esconde a satisfação ao apresentar-se como agricultora e integrante da Rede Carioca de Agricultura Urbana. “Pra gente era muito difícil ouvir que não tinha agricultura na cidade do Rio de Janeiro”, conta ela lembrando da formação da rede há sete anos.
O conhecimento produzido e compartilhados pelas mulheres é como as sementes crioulas: tesouro guardado e protegido por várias mãos. Vai florescendo em silêncio, como as frutas da estação que enchem os olhos dos passantes nas feiras agroecológicas que resistem nas grandes cidades. Na noite de ontem, ao receberem das mãos das companheiras de aula os diplomas referentes à participação no Curso Mulheres e Economia, as 35 “formandas” abraçaram umas às outras festejando o conhecimento partilhado. As sementes retornavam então às mãos de origem, à posse de quem, por fim, é responsável pela produção do amanhã.
Se a economia se mostra assunto nebuloso que guarda relação com números, cifras e taxas repassadas nos noticiários, durante a formação, ela foi tratada como parte inseparável do cotidiano das mulheres. Luciana de Andrade, moradora da Vila Carioca, lembrou a expressão citada nos primeiros dias de aula, da filósofa feminista Simone de Beaouvoir: “como diz aquela frase, eu me tornei mulher nesse curso. Foi um grande aprendizado até para a minha vida pessoal”, e abriu o sorriso, tranquila apesar da ousadia do que acabara de dizer.
A economia na mão das mulheres
O curso Mulheres e Economia é uma ação do Pacs que este ano completa dez anos de existência formando mulheres sobre temas como trabalho, saúde, acesso a políticas públicas, endividamento público, economia solidária, dentre outros. A edição deste ano contou com a parceria do Núcleo de Estudos Urbanos da Fundação Educacional Unificada Campograndense (Neurb / Feuc) e da Universidade da Cidadania (UFRJ) e com o apoio da Pão para o Mundo, do Sindicato dos Professores do Município do Rio de Janeiro e Região (Sinpro) e do Instituto de Formação Humana e Educação Popular (IFHEP). A formação teve carga horária de 30 horas e ofereceu certificado de extensão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Marcando o término de mais uma turma, acontece nos próximos dias 12, 13 e 14 deste mês, em Teresópolis, o Seminário Olhares feministas sobre a economia política e o mundo do trabalho. Mais informações aqui.
Texto: Pacs
Foto: Iara Moura / Comunicação Pacs.