Na próxima segunda-feira (3), uma audiência pública no Senado, em Brasília, discutirá a questão migratória haitiana. De acordo com o Instituto de Migrações e Direitos Humanos, estima-se que 54.373 mil haitianos tenham chegado ao Brasil até final de 2014. A rede Jubileu Sul Brasil, que estará presente na audiência, entende o processo migratório como uma consequência de uma série de questões nas quais o Brasil tem envolvimento, uma vez que há 11 anos está à frente do comando das tropas da Missão das Nações Unidas para Estabilização no Haiti (Minustah).
Para a rede, essa audiência, de autoria do senador Paulo Paim (PT/RS) é uma oportunidade de realizar um debate aberto com a sociedade brasileira, pois ao longo desses 11 anos pouco se discutiu sobre o real papel do governo brasileiro nesse contexto e que responsabilidades terá no desdobramento desta missão. Violações aos direitos humanos, ingerência política, repressão a protestos populares, epidemia do cólera e uma onda massiva de migração são sérias consequências de todo este processo.
“Essa audiência pode servir para quebrar um pouco do ‘pacto de silêncio’ que existe sobre esse tema e permitir uma avaliação das responsabilidades do Brasil para com a situação presente e futura do Haiti. Pois não adianta simplesmente anunciar que vai retirar as tropas sem fazer um balanço da situação deixada para trás, avaliar quem perdeu e quem ganhou com a presença da Minustah, por exemplo”, afirma o membro do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS) e da rede Jubileu Sul Brasil, Miguel Borba de Sá. O ministro de Defesa, Jacques Wagner, anunciou a retirada das tropas para fim de 2016.
Há muita expectativa, portanto, das entidades, redes, organizações e movimentos sociais, que há anos estão empenhados na Campanha Permanente de Solidariedade com o Haiti, que pede a retirada imediata das tropas da Minustah como forma de garantir a autonomia social e política do povo haitiano. A campanha é feita conjuntamente com organizações populares haitianas, que também reivindicam sua soberania. A presença da Minustah, inclusive, foi tema de um recente Colóquio, realizado em Porto Príncipe.
Para Miguel, “com a audiência pública será possível cobrar explicações dos responsáveis por esta operação: será saudável para a democracia ter os ministérios da Defesa e Relações Exteriores (Itamaraty) ao lado de imigrantes haitianos, movimentos sociais e organizações da sociedade civil”.
Mesmo tendo como tema central a questão migratória, a rede Jubileu Sul Brasil espera que alguns pontos concretos também possam entrar em pauta nesta audiência: retirada imediata das tropas do Haiti; um plano de ação do governo brasileiro para a retirada das tropas que permita uma transição segura e que garanta reparações às vítimas da Minustah; compromisso pela criação de uma verdadeira e ampla política de acolhimento para os haitianos que chegam em crescente número ao Brasil; o estabelecimento de normas de conduta para empresas brasileiras que atuam no Haiti, que garanta os direitos laborais, ambientais e sociais das populações empregadas; e o cancelamento imediato da dívida externa haitiana, sem imposição das IFIs (FMI e Banco Mundial) ou das Transnacionais sobre o governo a ser eleito no Haiti este ano.
“O Brasil precisa assumir as responsabilidades pelas decisões que tomou ao interferir nos assuntos internos de uma nação soberana, após um golpe de estado em 2004. Temos que apoiar o direito histórico de independência, soberania e dignidade do povo haitiano. Nossa política externa deve ser guiada pelo respeito aos direitos humanos. Isso implica no fim da política de militarização atual, em prol de uma política de verdadeiro humanitarismo e solidariedade entre os povos, incluindo as populações das favelas ocupadas por forças do Exército em nosso próprio solo, como no Rio de Janeiro, a exemplo dos complexos do Alemão e Maré”, disse Miguel.
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Por Rogéria Araujo/Rede Jubileu Sul Brasil.
Foto: O Vale