Em transmissão ao vivo, a mobilização do Grito iniciou uma série de encontros para aprofundar as inconsistências da independência do Brasil, que em 2022 comemora 200 anos.
Por Marcos Vinicius dos Santos*
Com o tema “Brasil: 200 anos de (in)dependência. Para quem?”, o 28º Grito lançou, na quinta-feira (7), a transmissão ao vivo, que vai se repetir a cada dia sete, como forma de mobilizar o chamado Dia D do Grito. A ideia é que o chamado Dia D do Grito essa seja uma mobilização permanente onde, de forma autônoma, as entidades, organizações e comunidades que realizam o Grito em suas regiões e territórios, desenvolvam atividades sempre no dia sete de cada mês.
A primeira roda de conversa do 28º Grito dos/as Excluídos/as contou com as participações de Sandra Quintela, educadora popular, economista e articuladora da Rede Jubileu Sul Brasil e de Adriano Gonzaga, afrobetizador, coordenador da UNEGRO e membro da coordenação do Grito dos/as Excluídos/as da Baixada Santista, em São Paulo. A mediação da conversa ficou por conta da secretária executiva da Rede Jubileu Sul Brasil, Rosilene Wansetto que também integra a coordenação do Grito.
200 anos de dependência
Duzentos anos depois de sua (in)dependência o Brasil ainda está preso à práticas coloniais. A situação fica mais evidente ainda quando se observa o atual cenário político e econômico do país. Como o Grito não ocorre somente no dia 7 de setembro, o movimento pretende debater a situação das dívidas financeira, histórica, social e ecológica geradas por esse processo, durante todo o ano de 2022.
Em sua fala de abertura Sandra Quintela lembrou que nem a data da independência pode ser real, como alguns historiadores apontam, mas o dia 7 de setembro é importante para “memorar” a data em um sentido mais amplo, onde são trazidas as inconsistências da nossa independência, que parece ter sido declarada só para algumas parcelas da população.
A Educadora Popular lembrou a carta aberta do padre Alfredo J. Gonçalves, publicada no último dia 2 de abril. O texto explica a história econômica do Brasil em um tripé. “O tripé que segura a história Brasileira, a história econômica brasileira, é o tripé do latifúndio, o do trabalho escravo e o da exportação de commodities”, disse Sandra Quintela.
Esse tripé se sustenta até hoje, como podemos observar no governo atual, que facilita a exploração de trabalhadores até as condições mais terríveis, além de acobertar grileiros e latifundiários que cometem ilegalidades e avançam sobre as terras brasileiras.
“O agronegócio, que sustenta muito esse tripé, da exportação e trabalho escravo, então é ele que representa hoje 10% do PIB[…], do Produto Interno Bruto, que é o indicador que mede todas as riquezas produzidas por um país, e emprega 6% da força de trabalho, apenas 6%, e tem hoje quase metade da bancada no Congresso Nacional. Compõe a bancada ruralista, olha isso gente, quase metade do Congresso”, continuou a economista.
“Não existe independência sem um povo independente”
É esse controle das decisões políticas por uma parcela pequena da população que completa 200 anos no próximo 7 de setembro. Nas palavras de Adriano Gonzaga, “Não existe Independência sem um povo independente. E a gente não pode também esquecer que esse processo de Independência, ele está é vinculado a esse contexto de toda uma estrutura capitalista”, afirmou o articulador do Grito na Baixada Santista. Ao fazer essa análise, o Coordenador da UNEGRO reforçou que 1822 foi o ano em que o país passou de Monarquia para República, mas que isso não representou mudança efetiva no modelo de colonização. “Brasil independente, entretanto, olha só, depois da Independência, somente após 63 anos o Brasil instituiu a Lei nº 3270, que foi a lei do sexagenário”, lembrou Adriano Gonzaga.
A lei do sexagenário se mostrou inefetiva contra a escravidão, já que a expectativa de vida dos povos escravizados era bem menor do que os 60 anos de idade. A lei é um exemplo de como o país, mesmo se distanciando “oficialmente” de um modelo colonialista, segue reforçando práticas da época, priorizando o trabalho escravo, os latifúndios e a concentração de renda.
Um paralelo traçado por Adriano Gonzaga é com a atual Reforma da Previdência, que estende o tempo mínimo de trabalho até as idades mais avançadas, além de reduzir direitos e sufocar sindicatos.
Acompanhe a roda de conversa na íntegra:
*Com a supervisão de Jucelene Rocha