O diálogo, a construção compartilhada do conhecimento, o afeto, a percepção dos problemas coletivos, são aspectos fundamentais para a concretização do projeto democrático de enfrentamento e superação das dívidas sociais, das desigualdades históricas que precarizam a vida das mulheres e perpetuam vulnerabilidades
Por Jucelene Rocha – Jubileu Sul Brasil
Os processos formativos emancipatórios marcam a trajetória das pessoas que integram a Ação “Mulheres por Reparação das Dívidas Sociais”. A educação popular se constitui como metodologia de base fundamental, mas o que isso significa? Esta opção estratégica implica no reconhecimento dos saberes e experiências cotidianas de todas as mulheres e outras pessoas envolvidas nos processos e iniciativas. Significa reconhecer todas as realidades culturais, sociais, econômicas e religiosas, na construção de novos saberes e na organização popular, em vista das transformações e avanços desejados.
“Na construção dos momentos formativos, nossa abordagem metodológica está profundamente enraizada nos princípios da educação popular, que valoriza o conhecimento e a experiência das participantes, promovendo um processo de aprendizado coletivo, horizontal e transformador. Os momentos formativos são concebidos de maneira a empoderar as mulheres participantes, incentivando sua reflexão crítica e ampliando sua capacidade de ação”, explica a assessora pedagógica, Joseanair Hermes.
O diálogo, a construção compartilhada do conhecimento, o afeto, a percepção dos problemas coletivos, são aspectos fundamentais para a concretização do projeto democrático de enfrentamento e superação das dívidas sociais, das desigualdades históricas que precarizam a vida das mulheres e perpetuam vulnerabilidades. “Acreditamos que cada mulher traz consigo um conhecimento valioso, resultado de suas lutas e trajetórias únicas. Através do diálogo, podemos construir uma compreensão mais profunda dos desafios enfrentados e das soluções encontradas”, complementa Joseanair.
Em todas as ações e iniciativas, a Rede Jubileu Sul Brasil prevê uma série de processos formativos que incluem, de modo particular, temas centrais como o sistema da dívida pública e as lutas por reparações, especialmente com a população pobre que sofre as consequências mais agudas da desigualdade social; mulheres e juventude negra; povos originários e tradicionais.
“A formação empodera e contribui na formulação de posicionamento crítico. Promover a aproximação das mulheres em áreas como o campo da política, da economia, da compreensão do sistema da dívida pública, dos processos de financeirização, faz com que cada pessoa se envolva e perceba que estes não são temas de exclusividade para A ou B. Todas as pessoas podem e devem compreender para atuar diretamente nessas questões fundamentais para a superação das desigualdades sociais no Brasil”, afirma a secretária executiva da Rede Jubileu Sul Brasil, Rosilene Wansetto.
Esses processos formativos tanto colocam luz em temas gerais, como aguçam e fortalecem o interesse das mulheres a respeito de temas específicos de seus territórios e realidades locais. Assim refletem sobre seus direitos, promovem a organização popular e conseguem interferir em suas realidades e destinos.
“Apostamos fortemente na educação popular, com rodas de conversa, oficinas, seminários, cartilhas, dentre outros formatos, como a metodologia da cartografia social, um poderoso instrumento para a construção de um plano de resposta, diante dos problemas enfrentados pelas mulheres em seus territórios. Todos estes instrumentos contribuíram para que as mulheres envolvidas pudessem atuar na defesa de direitos, especialmente o direito humano à moradia e à reparação de todas as outras dívidas sociais”, destaca Rosilene.
Nos últimos dois anos, cerca de 1.000 mulheres foram alcançadas diretamente a partir de momentos formativos, seja participando de atividades de âmbito nacional ou de iniciativas locais, nas cidades envolvidas: Belo Horizonte (MG), Fortaleza (CE), Manaus (AM), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA), São Paulo (SP).
“Os momentos formativos desempenham um papel fundamental no fortalecimento das comunidades e das mulheres de diversas maneiras”, afirma Joseanair, que também destacou o empoderamento individual e coletivo; a ampliação da consciência crítica a respeito das estruturas de poder e das dinâmicas sociais que afetam a vida das mulheres; o fortalecimentos dos espaços de articulação e mobilização para a participação cidadã, a partir de uma rede de apoio vital para enfrentar os desafios; a quebra do isolamento; o desenvolvimento de lideranças confiantes e a transformação da realidade, como principais contribuições da Ação Mulheres para que as pessoas sigam juntas na luta por direitos e reparações.
Como resultado das trocas que se deram nos momentos formativos ao longo dos últimos dois anos, ou motivados por eles, nasceram diversos conteúdos, que são ao mesmo tempo, instrumentos para a formação contínua e frutos das experiências sistematizadas.
“As publicações desempenham um papel crucial, servindo como ferramentas de disseminação de conhecimento, mobilização e incidência. Elas representam uma maneira tangível de consolidar o aprendizado e compartilhar informações relevantes com as mulheres nas ocupações e comunidades onde atuamos. Têm um papel integral no processo formativo, conectando o aprendizado teórico às ações práticas e à transformação social. Elas são veículos poderosos para disseminar conhecimento, capacitar as mulheres, influenciar políticas e amplificar as vozes das comunidades em busca de justiça e igualdade social”, destaca Joseanair.
Os resultados dessas trocas estão disponíveis em forma de cartilhas, manuais, orientações metodológicas, sistematização de cartografia social, cartaz mural e outras produções como vídeos e podcasts, todos disponíveis na biblioteca do site, no Spotify e no YouTube.
“Durante este último período, que compreende dois anos do trabalho da Ação Mulheres nos territórios, tivemos uma grande produção de cartilhas. Foi uma série de seis, onde tratamos de diferentes temas que envolvem o cotidiano das mulheres e seus direitos, conhecimento sobre o sistema da dívida pública, dinâmica do orçamento público, direito à moradia e participação popular. Foi um tempo produtivo do conhecimento”, conclui Rosilene Wansetto.
Esta reportagem foi publicada originalmente na Revista Ação Mulheres de 2023, confira a publicação na íntegra.
As iniciativas da Ação “Mulheres por reparação das dívidas sociais” contaram com apoio do Ministério das Relações Exteriores Alemão, que garantiu ao Instituto de Relações Exteriores (IFA) recursos para implementação do Programa de Financiamentos Zivik (Zivik Funding Program). Também integraram o processo de fortalecimento da Rede Jubileu Sul Brasil e das suas organizações membro, contando ainda com apoios da Cafod, DKA, e cofinanciamento da União Europeia.
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