Documento será entregue aos presidentes Lula e Santiago Peña, para que considerem o ressarcimento da dívida histórica com as comunidades indígenas na revisão do Anexo C do Tratado de Itaipu, com início previsto ainda neste ano. As violações afetaram cerca de 600 famílias de 38 tekoha
Por Redação Jubileu Sul Brasil
Organizações do Brasil e Paraguai apresentaram nesta terça-feira (21) a “Carta de Apoio às reivindicações do povo Avá-Guarani Paranaense”, que será entregue aos presidentes Lula e Santiago Peña. As mais de 60 organizações que assinam o documento exigem reparação histórica pelo etnocídio cometido por Itaipu Binacional, e que o ressarcimento seja levado em consideração pelos dois países na revisão do Anexo C do Tratado de Itaipu, prevista para este fim de ano.
No Brasil, a entrega ocorreu na tarde deste 21 de novembro, no Ministério das Relações Exteriores do Brasil, em Brasília (DF), por Sandra Quintela, da coordenação da Rede Jubileu Sul Brasil (JSB), e Alessandra Miranda, secretária executiva da 6ª Semana Social Brasileira. De manhã, a carta foi entregue na mesa de entrada da Presidência da República paraguaia, em Assunção, com transmissão ao vivo pela Tarima Digital na página do Jubileu Sul Brasil e teve a participação de Ricardo Canese, parlamentar do Mercosul, e de David Cardozo e Oscar Rivas, da Sobrevivencia Amigos de la Tierra Paraguai.
Para os signatários da carta, a revisão do Anexo C tem que considerar “o grau de amortização das dívidas contraídas por Itaipu para a construção do aproveitamento’. Uma dívida que não foi quitada de forma alguma nestes 50 anos é, justamente, a dívida que a Itaipu Binacional contraiu com o povo Avá-Guarani Paranaense, que foi despojado de suas terras, águas e florestas que lhes pertencem”.
A iniciativa também visa alertar para a grave situação enfrentada pelo povo Avá-Guarani Paranaense, e denunciar o descumprimento da Convenção nº 107/1957 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da proteção aos indígenas.
Mais de quatro décadas após a formação do reservatório da usina, a hidrelétrica acumula uma dívida não paga pelas violações às cerca de 600 famílias de 38 tekoha. De acordo com a Convenção 107 da OIT, que já vigorava à época da construção da hidrelétrica, em 1975, “se uma comunidade indígena fosse despojada de suas terras, deveria receber a mesma quantidade de terras de igual qualidade, o que não foi feito”, pontua o documento.
Na carta, as organizações ressaltam ainda que os crimes contra a humanidade cometidos contra os Avá-Guarani são imprescritíveis, “e o mais digno seria que os povos paraguaio e brasileiro, por V.Ex.as representados, implementassem sem mais demora as devidas compensações a tais comunidades indígenas, concedendo-lhes de forma definitiva e segura as terras ancestrais, terras que lhes foram tiradas, ajudando também a Itaipu Binacional a reconstituir o ecossistema nativo, para o benefício de todos”.
Confira a íntegra da carta:
“Assunção/Brasília, 21 de novembro de 2023
Excelentíssimos
Presidentes do Paraguai e do Brasil
Santiago Peña e Luiz Inácio Lula da Silva
Ref.: Compensação de dívida à comunidade Avá-Guarani Paranaense e ao meio ambiente na revisão do Anexo C de Itaipú.
As organizações e pessoas abaixo assinadas, do Paraguai e do Brasil, se dirigem aos Excelentíssimos Presidentes para solicitar que levem em consideração a proposta apresentada pelas comunidades Avá-Guarani Paranaenses, em ambas as margens, violentamente despejadas por ambas as ditaduras militares na época de implantação da represa de Itaipú, ato que provocou um verdadeiro etnocídio até agora não reparado.
A revisão do Anexo C exige levar em conta “o grau de amortização das dívidas contraídas por Itaipu para a construção do aproveitamento”. Uma dívida que não foi quitada de forma alguma nestes 50 anos é, justamente, a dívida que a Itaipu Binacional contraiu com o povo Avá-Guarani Paranaense, que foi despojado de suas terras, águas e florestas que lhes pertencem.
De acordo com a Convenção nº 107/1957 da OIT, totalmente em vigor no momento do despejo, se uma comunidade indígena fosse despojada de suas terras, deveria receber a mesma quantidade de terras de igual qualidade, o que não foi feito. Como sabem, os crimes contra a humanidade não prescrevem e o mais digno seria que os povos paraguaio e brasileiro, por V.Ex.as representados, implementassem sem mais demora as devidas compensações a tais comunidades indígenas, concedendo-lhes de forma definitiva e segura as terras ancestrais, terras que lhes foram tiradas, ajudando também a Itaipu Binacional a reconstituir o ecossistema nativo, para o benefício de todos.
A própria Itaipu Binacional se beneficiará desta reparação em favor das comunidades Avá-Guarani Paranaense, que devem ver como os melhores aliados estratégicos para reconstituir e conservar o meio ambiente e, assim, melhorar a qualidade da água de Itaipu, sua única matéria-prima, uma forma de evitar que o reservatório – parte mais valiosa da hidrelétrica, pois permite o armazenamento de energia – continue a encher, como demonstram estudos da entidade binacional.
Pelo que foi brevemente exposto, pedimos que levem em consideração a carta que foi enviada aos Excelentíssimos Presidentes pelas comunidades Avá-Guarani Paranaense afetadas, que também juntamos aqui, e incorporem o tratamento desta dívida histórica imediatamente na revisão do Anexo C de Itaipu.
Respeitosamente”,
Assinam:
1. Asociación de ONGs del Paraguay POJOAJU/Paraguay
2. Associação Alternativa Terrazul/Brasil
3. Associação de Mulheres da Zona Leste/Brasil
4. Associação Latinoamericana de Micro, Pequenas e Médias Empresas Alampyme/Brasil
5. Auge Asociación Civil/México
6. Bambual Editora/Brasil
7. BNG – GALIZA/España
8. Campaña Itaipu 2023 Causa Nacional/Paraguay
9. Cátedra de Teoría Sociológica, Facultad de Humanidades y Ciencias Sociales, Universidad Nacional de Misiones/Argentina
10. CEAG Centro de Educación de Guarulhos/Brasil
11. Centro de Desarrollo Ambiental y Humano (CENDAH)/Panamá
12. Cidades Afetivas/Brasil
13. Círculo Intercultural/Paraguay
14. Coalición Mundial por los Bosques/Latino América
15. Colectivo Voces Ecológicas (COVEC)/Panamá
16. Coletivo Nacional dos Eletricitários – CNE/Brasil
17. Comissão Guarani da Verdade/Brasil
18. Comité de Iglesias para Ayudas de Emergencia (CIPAE)/Paraguay
19. Comuna Caribe/El Caribe
20. Confederación de la Clase Trabajadora CCT/Paraguay
21. Conferencia de Religiosas/os del Paraguay/Paraguay
22. Conselho Indigenista Missionário – CIMI/Brasil
23. Diálogo 2000 – Jubileo Sur Argentina/Argentina
24. Encuentro Patriótico/Argentina
25. Escola de Sustentabilidade Integral/Brasil
26. Federación de Entidades Vecinalistas del Paraguay FEDEM/Paraguay
27. Federación por la Autodeterminación de los Pueblos Indígenas FAPI/Paraguay
28. Fomento de Iniciativas para la Restauración de Ecosistemas (FIRE Paraguay)/Paraguay
29. FONASC – Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas/Brasil
30. Frente Francista Apytere Py/Paraguay
31. GEEMA – Grupo de Estudos em Educação e Meio Ambiente do Rio de Janeiro/Paraguay
32. Gestión Local/Paraguay
33. Grito dos Excluídos Continental Brasil/Brasil
34. Haïtienne de Plaidoyer pour un Développement Alternatif PAPDA/Haiti
35. Heñói/Paraguay
36. Instituto Calliandra de Educação Integral e Ambiental/Brasil
37. Instituto Federal do Paraná (IFPR)/Brasil
38. Instituto Latinoamericano de Comunicación “Juan Díaz Bordenave”/Paraguay
39. Instituto Socioambiental del Sur, escuela de la Sustentabilidad/Paraguay
40. Jubileu Sul Brasil/Brasil
41. Jubileo Sur/Américas
42. MOCASE CLOC LVC/Argentina
43. Movimento Ciência Cidadã/Brasil
44. Movimento dos Atingidos pelas Barragens MAB/Brasil
45. Movimento dos Conselhos Populares/Brasil.
46. Movimiento Campesino Paraguayo MCP/Paraguay
47. Movimiento Nacional Campesino Indígena MNCI-CLOC – La Via Campesina-LVC/Argentina
48. Mundo Guarany – Paraguay/Brasil/Argentina
49. Observatório da Temática Indígena na América – OBIAL/UNILA/Brasil
50. Our Voice/Paraguay
51. Pastoral Indigenista da diocese de Foz do Iguaçu/Brasil
52. Política Alternativas para o Cone Sul (PACS)/Brasil
53. Red de Entidades al Servicio de los Pueblos Indígenas REDESPI/Paraguay
54. Red de Organizaciones Ambientalistas del Paraguay ROAM/Paraguay
55. Rede Ecumênica da Água/Brasil
56. Sindicato de Trabajadoras y Trabajadores de la Facultad de Ciencias Sociales de la Universidad Nacional de Asunción (STRAFACSO)/Paraguay
57. Sindicato de Trabajadores de la Administración Nacional de Electricidad SITRANDE/PARAGUAY
58. SOBREVIVENCIA, Amigos de la Tierra Paraguay/Paraguay
59. Sociedad Científica de Agroecología, Agricultura Familiar Campesina y Economía Solidaria-Paraguay SOCAAFES/Paraguay
60. Sociedad de Comunicadores del Paraguay SCP/Paraguay
61. Sociedad de Estudios Rurales y Cultura Popular – SER/Paraguay
62. TEKOHA Con Los Pueblos Indígenas/Paraguay
63. Tierra Libre, Instituto Social y Ambiental/Paraguay
64. Unión de Organizaciones y Ciudadanos/as de Ñeembucú. UOCÑ/Paraguay
65. Viernes por el Futuro/Paraguay
66. Water Justice and Gender/Países Bajos