Violações ao povo Avá-Guarani (Paraná) vão desde falta de regularização de terras, de vacinação em plena pandemia, além de tentativas de assassinato de lideranças e do impacto à saúde nas comunidades atingidas pelos agrotóxicos do agronegócio
Por Flaviana Serafim – Jubileu Sul Brasil, com informações do Cimi Regional Sul
As práticas de genocídio pelo governo de Jair Bolsonaro contra os indígenas Avá-Guarani, do Oeste do Paraná, foram denunciadas à Organização das Nações Unidas (ONU) neste 9 de maio. O documento com relato das violações foi entregue pelas lideranças Celso Japoty Alves e Vilma Vera Rios, que foram ao Mato Grosso do Sul ao encontro da sub-secretária-geral da ONU e assessora especial para Prevenção do Genocídio das Nações Unidas (ONU), Alice Wairimu Nderitu.
A relatora da ONU recebeu o documento e se comprometeu a encaminhar junto às Nações Unidas e ao governo brasileiro. Nderitu realizou sua primeira missão oficial ao Brasil de 2 a 12 de maio, em visita que tem foco na situação dos povos indígenas, afrodescendentes e outros segmentos vulneráveis do país. Entre outros, ela esteve no Tekoha Guyraroká, dos Guarani e Kaiowá (MS), e na Terra Indígena Yanomami, entre Amazonas e Roraima.
Gestão Bolsonaro causou mortes e ampliou invasão de terras indígenas Avá-Guarani
As violações vão desde à falta de combate às invasões de terras indígenas, de vacinação na pandemia de Covid-19 até tentativas de assassinato de lideranças devido aos conflitos por demarcação, casos que foram denunciados à política mas sem nenhuma investigação. Um dos casos é do líder indígena Ilson Soares, que sofreu sete tentativas de homicídio.
No tekoha Guasu Ocoy/Jacutinga, em Diamante do Oeste, há três comunidades indígenas em áreas regularizadas e sete em retomada das terras originárias, enfrentando processos de reintegração de posse pelo governo do Paraná e pela Itaipu Binacional. Em plena pandemia de Covid-19, as comunidades sofrem com falta de saneamento básico, energia elétrica, escolas e postos de saúde indígena. Durante a gestão de Bolsonaro, o governo federal também não tomou medidas de proteção territorial e combate às invasões da terra indígena.
A carta entregue à ONU relata outra triste sequela da pandemia, especialmente entre adolescentes e jovens indígenas: 16 suicídios e 25 tentativas de suicídio, entre março de 2021 e abril de 2023. De acordo com a denúncia, os Avá-Guarani que trabalhavam em frigoríficos não foram liberados para vacinação apesar da determinação judicial. Quando foram liberados pela empresa já haviam se contaminado e transmitiram o vírus para mais de 150 pessoas da comunidade. A situação resultou na morte do rezador Gregório Venega.
“O Estado, o governo, nos matam. Todo dia um parente morre, seja pela bala ou pelo veneno dos agrotóxicos. Além disso, estamos perdendo nossos jovens para o suicídio. Falam que o jovem é o futuro, só que estão matando nossos jovens, que muitas vezes morrem do que chamamos depressão, mas são mortos pelo Estado”, disse Vilma durante a cerimônia de entrega das denúncias à secretária-geral da ONU.
Na Terra Indígena Tekohá Guasu Guavira, entre os municípios de Guaíra, Terra Roxa e uma Altônia, o problema se repete na falta de regularização fundiária e de infraestrutura básica moradia, água, eletricidade. No documento, os indígenas afirmam que suas terras estão cercadas pelo agronegócio de soja e milho, cultivos que despejam “permanentemente milhares de litros de água envenenada, atingindo nossas casas, nossos pequenos animais, nossas poucas plantinhas, e em especial sobre nossos corpos”.
Em 2018, a demarcação da terra indigena foi questionada na Justiça Federal pelo município de Guaíra e a identificação para delimitar a área foi declarada nula em 2020, pelo juiz Gustavo Chies Cignachi. No mesmo ano, o então presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Xavier, em vez de recorrer da decisão judicial editou uma portaria anulando os estudos sobre Guasu Guavira e retirou a área da listagem de terras para regularização.
A denúncia também aponta que a omissão da Funai permitiu que a terra indígena “fosse invadida para a construção de empreendimentos, como é o caso da construção de uma cadeia pública, por parte do governo estadual do PR”. O governo Bolsonaro ainda planejou a construção da Ferroeste, ferrovia que passaria por área dos indígenas para transportar soja do Mato Grosso do Sul até o porto de Paranaguá (PR).