Por Marcos Arruda | PACS e Rede Jubileu Sul
Há polêmica sobre se é ou não acertado para a Grécia convocar uma consulta popular para iluminar a difícil decisão relativa à proposta dos credores da dívida pública grega de um novo pacote de ajuste extremamente penoso para a economia, o governo e o povo. Há os que dizem que, se o povo grego recusar o pacote, estará escolhendo distanciar-se da modernidade e lançar-se num abismo de isolamento. Melhor seria, aconselham, deixar para os políticos esta decisão.
O PACS aposta nas consultas populares como uma forma de radicalizar a democracia. Principalmente em se tratando de política econômica. Elas são uma forma de democracia direta, que envolve a população em decisões de interesse estratégico para a Nação. A democracia republicana, de caráter meramente representativo, reduz a participação popular à escolha do governo através do voto. A falta de instrumentos reais de participação popular no planejamento e na gestão do desenvolvimento, assim como nas decisões que afetam sua qualidade de vida, reduz a ‘democracia’ ao ato de votar, correspondente a assinar um cheque em branco e entrega-lo aos políticos que forem eleitos. As consultas populares ampliam o alcance da participação popular e, portanto, a qualidade e a autenticidade da democracia.
A Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI), que tem liderado as negociações com a Grécia, está chantageando a Grécia: sob sua coordenação o Eurogrupo, composto de 18 ministros europeus, reunidos em Bruxelas oferece 15,5 bilhões de euros em troca de um programa de ‘ajuste’ que esmaga ainda mais brutalmente o povo grego do que os ajustes anteriores têm feito, desde a crise que explodiu em 2008. O governo grego não aceitou esta chantagem. Ciente de que as obrigações da dívida com o FMI (1,6 bilhões de euros) vencem no fim de junho, e ameaçado pela posição inflexível dos credores, convocou um referendo para o domingo, 5.7.15, reconhecendo o direito da população do país de se manifestar sobre um assunto que afeta diretamente os interesses de toda a Nação e de cada família. E pediu ao Eurogrupo que prolongasse o atual programa de ajuda por mais cinco dias, até a realização da consulta popular. A resposta foi negativa.
Note-se que o governo anterior, com a cumplicidade dos banqueiros internacionais, havia criado artifícios que o endividaram ao ponto de a dívida pública ter chegado a 300% do valor do PIB grego. Quanto dessa dívida é ilegal e/ou ilegítima? Quanto dela realmente beneficiou o povo e a Nação? Quem foram os responsáveis pelo sobreendividamento? Está-se levando em consideração a responsabilidade dos credores em dar empréstimos que arriscavam não ser usados para os devidos fins e, portanto, de não ser honrados?
Estas perguntas estão sendo respondidas pela auditoria iniciada há poucos meses pelo governo grego.
A Islândia fez um plebiscito em 2010, a população rejeitou o acordo com o FMI e o pagamento aos credores ingleses e holandeses, que seriam espoliativos para a economia social islandesa. Ao explodir a crise da dívida, o povo foi para as ruas, derrubou o governo e influiu no esquema de negociação do novo governo com os credores. As ruas deram o sustento necessário ao novo governo para negociar de forma soberana, não aceitando imposições do FMI, da União Européia nem dos outros credores. Os governantes responsáveis pelas bolhas especulativas – financeira e imobiliária – foram presos. De forma heterodoxa, e com forte apoio popular, o novo governo reestruturou o sistema financeiro estatizando os três maiores bancos, em vez de salvar os banqueiros privados da falência. Reduziu as dívidas das empresas não financeiras, famílias e indivíduos. Foi capaz, assim, de reativar a economia, que em poucos meses voltou ao equilíbrio. Por que a Grécia não pode seguir também um caminho heterodoxo, soberano e democrático, aprendendo do êxito da Islândia?
Outro modo de desenvolvimento da Grécia é necessário e urgente. Ele deve ser construído de baixo para cima. Saudamos a iniciativa do governo grego de convocar uma consulta popular no próximo domingo sobre aceitar ou não o plano de ajuste da Troika. Destinar recursos do orçamento para pagar a divida financeira? Ou para resgatar a dívida social para com seu povo?
No momento em que o Papa Francisco convoca a humanidade a uma mudança de paradigma, do egocentrismo, do antropocentrismo e da tecnocracia para a solidariedade, o cuidado com a Vida e sua evolução, e a fé no ser humano, no seu sentido colaborativo e na sua criatividade; no momento em que ele acena para um horizonte de esperança ao afirmar a necessidade de uma nova cultura e civilização centrada no amor como respeito à diversidade da natureza e da vida, da humanidade, das consciências; é este o momento de os países e as classes ricas mostrarem generosidade e altruísmo; é este também o momento de os países de alta incidência de pobreza e as classes oprimidas ficarem firmes na luta pela justiça social e ambiental, e pela superação das desigualdades.
Todo o apoio ao referendo popular sobre a proposta de plano de ajuste feita pelos credores ao governo da Grécia!