“Bem-aventurados os que promovem a paz,
porque serão chamados filhos de Deus.”
(Mateus 5,9)
Há tempos o sistema prisional brasileiro, cada vez mais superlotado, degradado e torturante indicava que algo perigoso corroía o tecido democrático do país. Com o silêncio ou a cumplicidade de sucessivos governos e das instituições do Sistema de Justiça, as violações sistemáticas de direitos fundamentais da população presa, a crescente militarização da gestão dos conflitos sociais e o ódio semeado contra os alvos históricos da justiça criminal já apontavam para uma profunda decomposição do projeto de justiça social que inspirou muitos dos nossos constituintes em 1988.
Na atual eleição presidencial, dominada por “figuras redentoras”, pela crítica vazia a “tudo que está aí” e marcada pela manipulação política do medo, do preconceito e da frustração contra as instituições, o esvaziamento programático do debate eleitoral, que já vinha se agravando nos últimos pleitos, deu lugar à absoluta irracionalidade e à incitação explícita da violência.
Em nome de um pragmatismo cego e de uma busca por vitórias eleitorais a qualquer custo, a política foi sucessivamente reduzida a palavras de ordem, estratégias de marketing e agora à “hashtags”, “memes” e notícias falsas que convulsionam o processo democrático.
No que toca às políticas prisionais e de segurança pública, que há muito tempo se tornaram o principal campo para as barganhas programáticas pelos votos ditos conservadores, algumas das propostas em discussão flertam com o caos e com um aprofundamento sem paralelo da barbárie.
O candidato do Partido Social Liberal (PSL), que promete o fim da progressão penal e das saídas temporárias, a redução da maioridade penal para 16 anos, o armamento da população, a tipificação de ocupações rurais e urbanas como crime de terrorismo e uma absurda “excludente de ilicitude” genérica para todos os atos praticados por policiais em serviço, além de não atacar nenhuma das causas da violência e da sensação de insegurança disseminada entre a população, na prática, incita a sociedade brasileira para um conflito deflagrado e para o colapso prisional.
Esse é o mesmo candidato que, entre insinuações autoritárias, louvações a torturadores, declarações racistas, machistas e que atacam a vida e a dignidade da população LGBT, chamou a Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB) de “parte podre da Igreja Católica” e atacou o trabalho histórico e internacionalmente reconhecido do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Por extensão, também atacou todas as Pastorais Sociais e todos os irmãos e irmãs que fazem da sua vivência espiritual uma opção cotidiana pelos mais pobres.
Nesse momento difícil pelo qual passa o país, mais do que repudiar essas falas e propostas antidemocráticas, pedimos, humildemente, aos milhares de agentes da Pastoral Carcerária espalhados pelo Brasil que mantenham viva a profecia; que continuem dando testemunho em suas paróquias e comunidades sobre a desumanidade das prisões; que não desanimem frente aos enormes desafios que se avizinham e continuem semeando esperança, solidariedade e fé onde os poderosos cultivam apenas desespero, ódio e cinismo.
Sobretudo, independentemente do resultado das eleições presidenciais, mais do que nunca será o momento de estarmos juntos da população presa e dos seus familiares, prestando todo apoio que estiver ao nosso alcance, compartilhando das suas angústias e fortalecendo sua luta cotidiana, pois “nossa fidelidade ao Evangelho exige que proclamemos a verdade sobre o ser humano e sobre a dignidade de toda a pessoa humana, em todos os espaços públicos e privados do mundo de hoje” (CELAM, DAp, 390).
Irmanados com todos os membros da Pastoral Carcerária, com as demais Pastorais Sociais e com as organizações e movimentos que assinam a Agenda Nacional pelo Desencarceramento , manifestamos nosso apoio irrestrito à nota da CNBB e reafirmamos nosso compromisso de seguirmos firmes na luta pela realização do sonho de Deus: um mundo sem prisões!
Pastoral Carcerária Nacional