Por Maria Lucia Fattorelli
A paralisação dos caminhoneiros trouxe à tona a fragilidade do modelo econômico adotado no Brasil, voltado para o atendimento dos interesses de rentistas do Sistema da Dívida, de acionistas de grandes empresas como a Petrobrás, e de corporações internacionais que dominam o mercado de petróleo no mundo.
A principal reivindicação dos caminhoneiros diz respeito ao abusivo preço dos combustíveis no Brasil, o que afeta não somente a categoria dos caminhoneiros, mas também o funcionamento de toda a economia e a vida das pessoas, tendo em vista que o preço dos combustíveis influencia na formação de todos os demais preços de bens e serviços.
Os tributos indiretos incidentes sobre os combustíveis elevam o seu preço e têm sido sistematicamente aumentados a patamares irresponsáveis, acirrando as injustiças do modelo tributário regressivo praticado no Brasil, concentrado – em mais de 60% – na tributação sobre o consumo, que não respeita a capacidade contributiva e recai mais pesadamente sobre os mais pobres.
A recente elevação do preço dos combustíveis para os consumidores decorreu também da política de preços adotada pelo então presidente da Petrobrás, Pedro Parente, que passou a praticar preços tão elevados que favoreceu a importação de diesel e outros derivados, à mercê das cotações de preços internacionais e das oscilações do dólar, levando a Petrobrás à ociosidade de refinarias, à perda de mercado e, evidentemente, à produção de prejuízos decorrentes dessa política, os quais estão sendo usados para justificar a privatização fatiada dessa gigante petrolífera brasileira.
Todos esses fatores têm relação com o Sistema da Dívida:
– A elevada arrecadação tributária baseada principalmente nos tributos indiretos tem servido, em última análise, para sustentar o ajuste fiscal e garantir o privilégio de grandes bancos, por exemplo, mediante a remuneração diária de sua sobra de caixa, que custou aos cofres públicos quase meio trilhão de reais nos últimos 4 anos e constitui um dos mecanismos ilegais de geração da questionável dívida pública brasileira que nunca foi auditada, como manda a Constituição;
– Os recursos obtidos com a privatização de empresas no Brasil têm sido (desde Collor, passando por todos os presidentes que o sucederam até aqui) destinados principalmente para o pagamento da chamada dívida pública;
– Os lucros bilionários computados historicamente pela Petrobrás têm servido para beneficiar os acionistas privados e também o próprio Sistema da Dívida, uma vez que a Lei 9.530/1997 obriga que todos os dividendos distribuídos pelas estatais ao governo federal sejam destinados para as amortizações da dívida pública.
Em vez de sacrificar continuamente a sociedade brasileira com esse modelo econômico equivocado, a solução está no enfrentamento dos privilégios do Sistema da Dívida (que tem crescido em função de mecanismos meramente financeiros, sem qualquer benefício ao país; nunca foi auditada, e todo ano consome quase a metade do orçamento federal, afetando também os orçamentos de estados e municípios) e no avanço de uma Reforma Tributária Justa (que aumente a arrecadação sobre o patrimônio e a renda; reduza a carga dos tributos indiretos que oneram o consumo, e elimine privilégios como a isenção na distribuição de lucros e dividendos; isenção na remessa de lucros ao exterior; isenção para rentistas internacionais; dedução de juros sobre capital próprio entre outras injustificadas benesses).
Essa crise se apresenta como uma grande oportunidade para a conscientização geral sobre a elevada conta que está sendo imposta à sociedade brasileira, por meio desse modelo econômico que vem entregando nossas riquezas, impondo o atraso socioeconômico do nosso rico Brasil e jogando a imensa maioria da população na pobreza e miséria. O Sistema da Dívida está entre os principais fatores que provocam esse inaceitável cenário de escassez, que não combina com a realidade de abundância que existe no Brasil. Por isso é importante que toda a sociedade cobre o compromisso de candidatos com a realização da AUDITORIA JÁ!
*Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida