D. Demétrio Valentini*
Os recentes acontecimentos na América Latina mostram como os laços de solidariedade entre os seus países são ainda muito frágeis. Sobretudo quando se trata de urgir a lisura democrática nos processos de decisões políticas, é propriamente nula a influência dos posicionamentos oficiais expressos pelos países que entre si já firmaram, de maneira solene, compromissos formais com a democracia.
Esta fraqueza de persuasão faz com que as tomadas de posição dos países assumam a configuração de formalidades, aparentando convicções democráticas, mas na verdade significando a concordância tácita diante de decisões que atropelam a democracia. A tradição golpista ainda se legitima, respaldada na certeza de que será tolerada, acabará sendo aceita, e por fim apoiada.
E tudo continua como se todos fossem democratas confessos, políticos convictos e militantes ativos da ordem constitucional.
Mas da democracia se cuida só as aparências, deixando espaço para manobras que possam eventualmente ser úteis para a manutenção de interesses de minorias privilegiadas, que, evidentemente não podem ficar atrelados a formalidades da democracia.
Desde meados do século passado, os países latino americanos viveram momentos privilegiados de despertar de sua própria identidade, e de afirmação de sua legítima autonomia.
Houve momentos em que a afirmação da própria autonomia, contou com o eficaz apoio da presença e da atuação da Igreja, incentivando os cidadãos a assumirem suas responsabilidades políticas.
Os momentos de sintonia entre a atuação da Igreja e o compromisso de ação democrática dos cidadãos, se constituíram nos tempos mais promissores, que permitiam sonhar com um verdadeiro processo de libertação integral e de afirmação positiva dos países latino americanos.
Mas estes momentos propiciaram a reação orquestrada de ditaduras de direita, apoiadas por quem queria que a América Latina continuasse submissa aos seus interesses estratégicos.
Nos últimos anos, parecia se fortalecer, de vez, a prática democrática, com a coincidência de governos eleitos democraticamente, e que contavam com o respaldo popular para a sua atuação democrática.
O recente episódio de destituição de um presidente, eleito democraticamente, e deposto com procedimentos que mal disfarçavam suas intenções golpistas, mostra quando ainda é frágil a democracia nos países latino americanos, seja na prática interna de cada país, seja no relacionamento externo entre os países formalmente unidos em torno de tratados de ordem econômica ou política.
Só a efetiva, e pertinaz, prática interna da democracia, poderá fortalecer o posicionamento comum dos países latino americanos.
Até que ela não se consolide, continuará capenga a democracia na América Latina.
*Bispo de Jales.