‘O espírito do Senhor repousa
sobre mim para que eu possa
por em liberdade todo aquele
que se encontra aprisionado’ (Lc.4)
Estamos ainda atordoados pelas cenas de violência veiculadas pela imprensa e pelas redes sociais exibindo presos seviciados e decapitados por outros presos, ônibus e inocentes incendiados nas ruas de São Luis, depoimentos de familiares de internos da penitenciária de Pedrinhas sendo ameaçados e chantageados pelas lideranças das facções que controlam o presídio e, enfim, denúncias de supostos espancamentos e humilhações por policiais e agentes penitenciários.
Muito se tem escrito e comentado sobre o caos no sistema prisional do Maranhão. Parece ser a bola da vez, como o foram, alguns anos atrás, os estados do Espírito Santo, de Rondônia, do Rio, de São Paulo… Assistimos, nesses dias, aqui, às mesmas cenas que, anos atrás, aconteceram em outras cidades do Brasil.
Uma realidade que permanece imutável, em que pesem as poucas novas penitenciárias construídas no País nesses últimos anos. Reações e análises fruto da emoção do momento, de visões equivocadas e de leituras superficiais não dão conta do recado que Pedrinhas, nesse momento, vem lançando ao “estado democrático de direito” e à sociedade brasileira.
Nós Missionários Combonianos, com atuação pastoral em diferentes penitenciárias do País, entendemos que os dramáticos acontecimentos de São Luis são mais uma consequência da caótica situação do sistema penitenciário brasileiro que, além das falhas estruturais e de problemas de superlotação, enfrenta o controle por parte de organizações criminosas graças à omissão ou até à cumplicidade de pessoas infiltradas nas instituições públicas.
Não se trata de relativizar ou até livrar de responsabilidades legais aqueles poderes e instituições públicas locais, pelo vórtice de violência em que mergulha o Maranhão, mas de alertar sobre a atuação do crime organizado que espalha o terror para tentar desestabilizar o estado de direito e continuar perseguindo seus objetivos.
Perguntamo-nos: o que foi feito das conclusões da CPI de 2008 criada pelo Congresso Nacional – que teve como relator um deputado federal maranhense – tendo como objeto o sistema prisional nacional?
Quais os resultados efetivos nas penitenciárias do nosso País a partir da sua crescente militarização, concebida nos gabinetes da Federação?
Por que, apesar dos inúmeros relatórios nacionais e internacionais fruto de debates e de monitoramentos permanentes das nossas penitenciárias, as políticas públicas relativas ao público aprisionado continuam apostando muito mais na ‘justiça punitiva’, do que na ‘justiça restaurativa’ mesmo observando os seus resultados positivos?
Mesmo tendo consciência da complexidade e da gravidade do atual sistema prisional que vigora no País, nós Combonianos do Brasil, em nossa doação pastoral junto aos detentos, queremos apostar nas seguintes frentes:
1. Acompanhar, acolher, apoiar desde um ponto de vista humano e espiritual os encarcerados, independentemente dos crimes dos quais estão sendo julgados ou condenados, acreditando que o ser humano sempre tem condições de se resgatar e ser uma ‘pessoa nova’.
2. Defender de maneira intransigente, juntamente com todas as forças vivas da sociedade, a vida e os direitos dos aprisionados e seus familiares.
3. Investir maciçamente na pedagogia adotada pelos ‘círculos da justiça restaurativa’ como o instrumento mais adequado na resolução pacífica dos conflitos e na construção da cultura da paz.
4. Divulgar e fortalecer as iniciativas que comprovam a possibilidade de repensar a pena conforme outros paradigmas, apostando na recuperação do preso e no seu retorno positivo ao convívio social através da participação da comunidade. Entre elas apontamos a experiência da Associação de Proteção aos Condenados – APAC que vem atuando em vários lugares do País, inclusive no Maranhão.
Sem radicais e urgentes mudanças sociais e culturais dificilmente debelaremos o crime e a violência.
Acreditamos firmemente na capacidade de recuperação e de superação dos humanos em direção à vida plena, à paz sem fim.
São Luís, 10 de Janeiro de 2014